Durante boa parte do século passado, as relações de trabalho eram construídas num modelo de obediência cega. A empresa determinava o futuro das pessoas, movimentando as carreiras de acordo com as demandas de negócio. O plano de carreira era de longo prazo e previsível. O contrato psicológico significava entrar num local e a empresa cuidar da carreira.
Os planos de sucessão seguiam uma linearidade e previsibilidade no tempo. Alguém apontado para ser o sucessor tinha prazo e cadeira garantidos num modelo com estruturas grandes e que asseguravam essa estabilidade. O engajamento das pessoas ao longo do tempo era baseado nessa promessa sequencial de cargos.
Essa filosofia sucumbiu diante das transformações do mundo dos negócios. As estruturas não são mais previsíveis. Ao contrário, mudam com velocidade supersônica. Isso impede promessas de longo prazo baseada em cargos.
A sucessão contemporânea também precisa ser ajustada na forma de mapear os interesses de carreira dos indivíduos. Nos sistemas do passado era fácil inferir o que era melhor para os empregados considerando avaliações de desempenho e potencial. Depois cruzar com as demandas de negócio e construir um mapa. Esse sistema baseado na visão empresarial exclui ou minimiza as escolhas individuais e se torna um grave risco para as empresas. Por mais que possamos rechear o processo de sucessão com ferramentas, algumas com glamorosas siglas em inglês como “assessment”, “high potential”, “nine in box”, precisaremos repensar o equilibro entre interesse organizacional e visão de carreira do indivíduo.
Desde o final do século passado, o protagonismo na carreira vem ganhando força como uma forma de dar sentido prático para a responsabilidade do indivíduo na construção da sua carreira. Essa diretriz combina com o novo mundo do trabalho e dá clareza no papel de cada profissional na construção de sua trajetória agindo de forma curiosa e ativa na exploração de seu futuro profissional.
Nesse sentido, precisamos conectar a diretriz de protagonismo com os mapas de sucessão para que a visão de futuro da organização faça sentido com a narrativa de carreira do funcionário.
Segurança psicológica
Isso exige uma nova abordagem para o tema, começando pela construção de uma cultura de segurança psicológica que permita livre reflexão e diálogos transparentes entre líderes e sua equipe. Somente num ambiente de confiança e com conversas frequentes é possível construir reflexões potentes sobre carreira. Estimular gestores para estabelecer rituais permanentes de conversas sobre cenários de carreira, interesses e temas de desenvolvimento é um passo estratégico para a construção de planos de sucessão equilibrados e que sejam confiáveis.
Os comitês que discutem pessoas e mapas de sucessão também precisam repensar os modelos de comando e controle na forma de considerar a carreira e os movimentos dos indivíduos. A inferência é um pecado mortal na construção da carreira contemporânea.
Um estudo publicado pelas americanas Julie Winkle Giulioni e Beverly L. Kaye mostrou que 55% dos mapas de sucessão realizados em grandes empresas eram feitos com visão predominante da empresa e pouco incluíam interesses genuínos dos funcionários. Isso se deve à ausência de conversas e mapeamento desses interesses de carreira, e também a falta de liberdade para a livre discussão sobre carreira. Isso torna os mapas de sucessão altamente falhos.
A nova lógica de sucessão não exclui a visão da organização sobre os indivíduos e sim integra a visão de carreira para que os movimentos sejam equilibrados e coerentes com a filosofia baseada no protagonismo. Permitir a diversidade de carreiras e que cada um possa construir o seu projeto são as mais potentes estratégias para engajar as pessoas e garantir consistência nos planos de sucessão.