Desde 2016, Otávio Carvalheira, de 54 anos, lidera um processo de transformação na Alcoa, companhia americana de mineração que ocupa o topo do ranking As Melhores Empresas para Começar a Carreira de 2019, única pesquisa do mundo que analisa políticas de gestão para jovens de até 26 anos. Há três décadas na companhia, o engenheiro mecânico passou por diversos cargos antes de assumir como CEO. Um de seus muitos desafios no posto é atrair e manter profissionais da nova geração, considerados o futuro da organização. Para conseguir isso, o executivo vem incentivando práticas que chamem a atenção desse público exigente, que não leva em conta apenas um bom salário na hora de fazer escolhas profissionais. “Quando o jovem entende a importância da indústria de recursos naturais e se conscientiza da maneira como atuamos, respeitando o meio ambiente e as comunidades próximas a nós, ele se encanta com a Alcoa”, diz.
O que, em sua visão, levou a Alcoa ao título de Melhor Empresa para Começar a Carreira de 2019?
A Alcoa vem se modernizando ao longo dos anos para acompanhar a transformação digital. Temos práticas intensas de digitalização, robotização e automatização. E a nova geração trouxe uma grande inovação para dentro da empresa. Um grupo de jovens, por exemplo, desenvolveu um projeto que possibilita, por meio da utilização de óculos de realidade virtual, ao usuário ter a mesma visão do operador do porto ou de outras áreas da fábrica. Essa tecnologia é utilizada em programas de onboarding, em visitas e em feiras comerciais, proporcionando que empregados, stakeholders e clientes experienciem o dia a dia das operações. Além disso, nossa companhia valoriza a diversidade, promove o desenvolvimento e trabalha fundamentada em valores como integridade, excelência e cuidado com as pessoas. Todos esses aspectos conversam com os anseios dos jovens, que buscam cada vez mais propósito no ambiente de trabalho.
Os valores são importantes, mas eles bastam para atrair esse público tão exigente?
É preciso ter coerência nos processos e nas práticas. Em 2018, lançamos um novo ciclo de desenvolvimento de pessoas. Tiramos o foco da obrigação de conversas rígidas, com começo, meio e fim, e passamos a estimular diálogos em maior quantidade e com mais qualidade. As avaliações passaram a ser 360 graus. Para isso, trabalhamos a liderança para que entendesse a importância de feedbacks abertos, em que as pessoas tivessem liberdade para falar o que pensam e a possibilidade de se expor a outros níveis da organização. Os jovens desejam ser ouvidos e, assim, capturamos suas ideias e sugestões.
Um traço desse pessoal mais novo é não colocar o salário como algo decisivo para fazer escolhas profissionais. Como vocês trabalham essa questão com quem está em início de carreira?
A Alcoa tem uma política clara, estruturada e competitiva, do ponto de vista salarial e de benefícios, para atrair trainees e estagiários. Mas não vemos isso como o principal fator de atratividade. É importante, mas temos de ir além da compensação financeira. Uma peculiaridade dessa nova geração, por exemplo, é ter aversão a atividades repetitivas. Eles querem usar sua capacidade intelectual, analítica. Por isso, temos como premissa expor os jovens a desafios. Outra coisa que estamos fazendo é olhar para além das caixinhas acadêmicas. É inegável que nosso setor demanda geólogos e engenheiros. Mas precisamos de gente com visão de futuro e formações absolutamente diferentes daquelas a que estamos acostumados. Para que a empresa consiga resolver os problemas, que vão ser cada vez mais desafiadores, temos de valorizar a diversidade e a combinação de formações. Já temos o exemplo de um líder da Alcoa no exterior que é formado em música e ocupa uma função importantíssima.
A Alcoa considera ações sociais importantes para engajar os mais novos?
O voluntariado está em nosso DNA com o Instituto Alcoa, responsável pela maioria das parcerias nas comunidades onde atuamos. E os funcionários ficam sabendo da importância dessas iniciativas logo na integração. Comunicamos as ações por e-mail, quadros de aviso e alertas da liderança. Em 2018, investimos mais de 4 milhões de reais em voluntariado, com 31 ações sociais e 22 projetos comunitários apoiados. Ao todo, beneficiamos cerca de 28 000 pessoas e 170 organizações. Como abrimos as ações de voluntariado para a participação de familiares e amigos dos funcionários, isso gera um engajamento. Neste ano, contamos com 700 voluntários.
Você citou a proximidade da empresa com as comunidades nas quais possui operações. Jovens dessas regiões são absorvidos pela companhia?
Buscamos privilegiar as pessoas que estão próximas a nós. Nem sempre é possível ocupar as vagas com elas, mas há uma busca constante para preencher posições com talentos locais. Neste ano, contratamos a primeira mulher a se formar em engenharia na região de Juruti [município com 57 943 habitantes, no Pará, onde a empresa possui uma mina de bauxita]. Ela estudou na escola que a Alcoa implantou na comunidade e entrou no curso de engenharia da Universidade Federal do Oeste do Pará.
Atualmente, as companhias enfrentam a realidade de ter várias faixas etárias atuando na mesma empresa, da geração Z aos baby-boomers. De que maneira a Alcoa lida com o assunto para evitar conflitos?
Demonstramos aos empregados que nosso plano de sucessão está bem desenhado e que acreditamos na necessidade de a organização estar sempre arejando seu quadro. Não adianta eu ter uma área com um “supermegaespecialista” na mesma posição há 20 anos sem possuir um sucessor para ele. Nossos gestores são cobrados a desenvolver sucessores e a oferecer sempre desafios aos profissionais. Com processo de coaching e supervisão adequada, muitos jovens talentos emergem depois de assumir novos projetos. Tudo isso ajuda a diminuir o conflito entre as gerações.
Mas existe uma limitação para realizar movimentações e promoções, certo?
Sim, mas o fato de sermos uma multinacional e possuirmos processos bastante alinhados no mundo todo melhora esse cenário. Hoje, há a um intercâmbio grande entre os profissionais da Alcoa, porque a oferta de oportunidades é global. Isso traz uma necessidade maior do domínio do inglês, é verdade, mas, vencida essa barreira, há um leque de possibilidades internacionais — que só vem se intensificando. Temos exemplos de brasileiros desempenhando funções nos quatro cantos do mundo. De 2017 para cá, expatriamos 27 pessoas para Estados Unidos, Austrália, Canadá e países europeus.
Você mesmo viveu uma experiência na China. Como foi?
Eu trabalhei por lá de 2005 a 2008. Foi um desafio liderar duas fábricas e entregar resultados no curto prazo em um país de língua totalmente diferente, numa cultura que eu desconhecia. Naquele momento, eu entendi a importância do respeito à diversidade e ao diferente. Eu levei minhas competências ao limite nessa fase da carreira.
Nos últimos anos, empresas do setor de mineração foram responsáveis por dois dos maiores desastres ambientais do Brasil, com o rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. O que fazer para convencer uma geração tão atuante a trabalhar nesse segmento?
Falamos com transparência sobre o fato de a atividade de mineração ter impactos ambientais e tratamos isso com a seriedade de uma empresa que tem mais de 130 anos de experiência na área. Deixamos claro que jamais colocaremos o lucro à frente da segurança e do meio ambiente. O Brasil é um país riquíssimo em minérios e não pode abrir mão dessa riqueza, mas ela precisa ser utilizada de maneira sustentável. A Alcoa é um veículo de transformação nas regiões em que atua. Conseguimos levar até populações remotas, sem acesso a condições básicas de vida, desenvolvimento, emprego, educação e renda. Estamos em Poços de Caldas (MG) há 50 anos e contamos com o apoio dos moradores da cidade. O mesmo acontece em Juruti. Fazemos a extração de minérios com ética e respeito às leis e atuamos próximos às comunidades. Elas participam de simulações de evacuação e sabem o que deve ser feito em caso de acidente.