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Conrado Schlochauer

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Doutor em Psicologia da Aprendizagem pela USP, sócio da nōvi – a lifewide learning company, e autor do livro "Lifelong Learners"
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IA e RH: estamos atrasados, mas ainda dá tempo

Precisamos fazer o upskilling da área de recursos humanos para entender as possibilidades da inteligência artificial e influenciar as organizações.

Por Conrado Schlochauer, colunista de VOCÊ RH
Atualizado em 29 ago 2024, 16h39 - Publicado em 15 fev 2024, 16h56
Conceito de inteligência artificial representadas por silhuetas humanas
 (Eoneren/Getty Images/Reprodução)
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Por volta de 2017, eu fazia bolão com alguns amigos quando frequentávamos palestras sobre transformação digital. Vivíamos naquela época uma avalanche de conteúdos alarmistas (“Mude ou morra!”) sobre os impactos das novas tecnologias e da Quarta Revolução Industrial na vida das empresas e da sociedade como um todo.

No nosso bolão, tentávamos adivinhar o número de vezes que as expressões “disrupção/disruptivo” e “exponencial” seriam ditas pelos apresentadores. Os resultados chegavam sempre à casa das dezenas. 

Tentávamos adivinhar se haveria na apresentação o famoso gráfico da curva da tecnologia (exponencial) contraposta à curva da capacidade de adaptação humana (linear). Depois de um tempo, paramos: o slide estava presente em quase 100% das palestras.

Não vou negar, eu mesmo utilizava esse gráfico (que veio do livro Desculpe pelo Atraso, do jornalista Thomas Friedman) em minhas apresentações. Logo depois do gráfico, eu apresentava um slide que dizia: “Exponencial não é um jeito de ser. É matemática”.

Nós, humanos, temos dificuldade de lidar com o crescimento exponencial. Ele é pouco intuitivo. Contudo, a famosa curva (e a famosa Lei de Moore) apontava que essa era a aceleração com que novas tecnologias seriam desenvolvidas e introduzidas em nossas vidas. Para muitos, chegaria um ponto em que efetivamente teríamos muita dificuldade em interagir com o excesso de novidades.

Pois bem, acho que esse momento chegou. 

Um novo mundo começou a ser desenhado em 30/11/2022 com o lançamento do ChatGPT 3.5. De alguma forma, o que ocorreu estava previsto na curva exponencial. A simplicidade e a capacidade de criação da Inteligência Artificial Generativa causaram grande impacto, com uma adoção sem precedentes: apenas cinco dias foram necessários para atingir o primeiro milhão de usuários, superando o tempo de plataformas como Instagram (2,5 meses) e Twitter (2 anos).

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Não vou escrever aqui sobre a história da inteligência artificial (está por aqui há algumas décadas). Nem vou explicar os tipos de IA que existem e o que é a IA generativa. Essas informações estão em todo lugar. Se você ainda não tem uma compreensão sobre isso, vale a pena ir atrás. 

O fato é que a utilização em massa das ferramentas de IA generativa (como o ChatGPT, Copilot e Midjourney) marca um ponto de inflexão na necessidade de Aprendizagem ao Longo da Vida e na transformação do mundo do trabalho. E o RH, mais uma vez, tem um papel fundamental nesse movimento. 

Upskilling é o nome do jogo

O Fórum Econômico Mundial tem destacado o impacto das novas tecnologias nas organizações e nos empregos. Em um relatório recente, Jobs of Tomorrow, a instituição prevê que 23% das funções sofrerão mudanças nos próximos cinco anos devido à transformação da indústria, com destaque para o uso de inteligência artificial e outras tecnologias de processamento de texto, imagem e voz.

Se nós de RH queremos apoiar organizações e times nessa mudança, devemos entender de forma profunda o significado e impacto desse movimento, maneirando tanto na euforia quanto no mal-estar. Precisamos investir tempo de qualidade na compreensão das transformações pelas quais o mundo do trabalho passa hoje. E, honestamente, vejo pouquíssimos profissionais da nossa área priorizando esse assunto.

Por isso, o primeiro passo é fazer o nosso próprio upskilling. Não estou falando de aprender como escrever prompts (o que é muito importante), meu convite é para um olhar mais amplo. 

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Concordo com quem prevê que a AI causará mudanças importantes na nossa sociedade. Não é mais uma “tecnologia da vez”, posição em que já estiveram o metaverso e a VR (que têm e terão aplicações incríveis). Gosto do olhar do professor Yuval Harari, para quem a AI já hackeou o sistema operacional da civilização humana: “A democracia é uma conversa, e as conversas dependem da linguagem. Quando a IA hackeia a linguagem, pode destruir a nossa capacidade de ter conversas significativas, destruindo assim a democracia”. 

O mergulho inicial na nossa jornada de aprendizagem, portanto, é entender os impactos sociais, culturais, econômicos e políticos do avanço da IA.

Existe uma chance enorme de uma mudança radical no mercado em que sua empresa atua. Poucos passarão ilesos. Por isso, o segundo passo é garantir que a liderança tenha o conhecimento necessário para analisar o mercado à luz das transformações em curso. A capacidade de tomar decisões estratégicas está diretamente atrelada ao desenvolvimento de novas competências nos e nas líderes.

Kathleen Hogan, Chief People Officer da Microsoft, propõe uma lista que nos serve como ponto de partida para a discussão sobre quais seriam essas habilidades fundamentais. Para Hogan, o ambiente de trabalho nunca precisou tanto quanto hoje de: 

  • Julgamento analítico 
  • Flexibilidade 
  • Inteligência emocional 
  • Avaliação criativa 
  • Curiosidade intelectual 
  • Detecção e manejo de vieses 
  • Capacidade de delegar tarefas
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Acho essa lista criativa e precisa. Ela deixa claro como as soft skills vão ser fundamentais para compreender a IA, seja como ferramenta do dia a dia ou como tecnologia integrada que repensa processos e molda estratégia. 

Particularmente, adoro a junção de julgamento analítico e avaliação criativa. A partir delas, conseguimos criar uma habilidade fundamental: identificar quando vale a pena incluir a IA nos processos ou tarefas. Identificar casos de uso demanda conhecimento da tecnologia e um olhar criativo ao mesmo tempo. Saber quando usar é fundamental para aprender e criar impacto verdadeiro com a IA.

FOMO X JOLE

Em março do ano passado, tivemos uma reunião com todo mundo aqui na nōvi e ficamos algumas horas entendendo como essa ferramenta impactaria nosso trabalho em projetos de consultoria. 

Foram horas intensas. Por um lado, foi maravilhoso perceber como poderíamos utilizar as ferramentas de IA para transcrição de entrevistas, análise de dados quantitativos e até qualitativos, reuniões de brainstorming etc. Por outro, confesso que foi um pouco perturbador ver o ChatGPT criando planos de aula ou jornadas de liderança sozinho. Por enquanto, a entrega não tem nenhum grande lampejo criativo ou profundidade. Mas já é boa o suficiente para servir de ponto de partida.

Esse dia foi um marco para a adoção de IA como assistente em todos os nossos projetos, e os resultados têm sido maravilhosos.

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A partir dessa experiência, tenho uma sugestão para os times de RH que ainda não criaram um espaço estruturado na agenda para IA: faça isso o quanto antes. Como falei, o primeiro passo é o nosso upskilling. Mas, assim que o time entender o básico, identifique quais são os espaços mais óbvios em que as ferramentas podem ser utilizadas. 

Vejo muita gente usando para apoiar a criação de textos. Pessoalmente, acho os resultados medíocres, se não houver interação humana (este artigo foi escrito como os gregos faziam, sem qualquer apoio de IA – só uma revisãozinha…). Minha sugestão é imaginar as ferramentas como assistentes nos processos, como um novo membro do time que pode começar apoiando em reuniões de brainstorming, análise de textos, consolidação de pesquisas, e por aí vai.

O segundo passo é escolher um processo de RH para ser redesenhado a partir da lógica de IA. Alguns exemplos:

  • Fazer um chatbot para seu programa de onboarding
  • Iniciar análise mais profunda dos dados da área (people analytics)
  • Produzir descrições de vagas ou cargos
  • Mapear habilidades
  • Elaborar esboços de iniciativas de aprendizagem

Meu ponto principal é um só: comece (ou continue e dissemine se você já está com a mão na massa). A velocidade da mudança da própria IA assusta. Entretanto, ao acompanhar de perto, como tenho feito, fica claro que ninguém sabe muito bem para onde as coisas estão indo (a “saída” do CEO da OpenAI e as trajetórias dos plugins no ChatGPT são dois bons exemplos).

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Um último convite: calma. 

Isso pode parecer paradoxal, depois do texto acima. Mas um efeito colateral de ser soterrado com notícias de IA todos os dias é o temido FOMO (Fear of Missing Out), o medo de ficar por fora.

Esse sentimento é paralisante e, claro, acaba sendo um obstáculo para o aprendizado ou mesmo o interesse. Minha sugestão é trocar o FOMO pelo JOLE (Joy of Learning Everyday), a alegria de aprender um pouco todos os dias. 

A jornada de IA será longa e instável. O melhor a fazer é ficarmos atentos e conectados às oportunidades e evoluções. Esse é o caminho para influenciar o processo e ajudar pessoas e organizações no novo mundo de mudanças constantes.

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