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“Manda quem pode, obedece quem tem juízo”. Não nestas empresas

O índice de chefes coercitivos é baixo nas companhias ganhadoras do Guia VOCÊ S/A. Descubra as estratégias delas para criar líderes inspiradores

Por Erica Martin
Atualizado em 5 dez 2020, 20h48 - Publicado em 5 mar 2020, 10h00
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  • Um ser autoritário, que exerce a liderança seguindo a máxima: “Manda quem pode, obedece quem tem juízo”. É assim que Daniel Goleman, considerado o pai da inteligência emocional, descreve um chefe coercitivo.

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    Infelizmente, esse estilo de gestão, também chamado de tóxico por especialistas, causa estragos por onde passa. A boa notícia é que as empresas estão cada vez mais dispostas a mudar essa realidade, de acordo com dados do Guia VOCÊ S/A — As 150 Melhores Empresas para Trabalhar de 2019.

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    Em nosso questionário, feito em parceria com a FIA, perguntamos aos funcionários sobre lideranças diretas levando em conta seis perfis: coercitivo, inspirador, maternal, democrático, direcionador e instrutor. O resultado mostrou que, entre as 150 Melhores, os coer­citivos são a minoria e correspondem apenas a 10%.

    “Temos observado no mercado uma vontade de avançar para uma liderança mais humanizada. O modelo de comando e controle funcionava na Indústria 2.0. No mundo 4.0, ele não faz mais sentido e perde espaço”, diz Paulo Almeida, professor e pesquisador na área de pessoas e liderança da Fundação Dom Cabral.

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    A ThoughtWorks, empresa americana de tecnologia, que possui incidência de 3% de chefes tóxicos, uma das menores taxas deste Guia, é um exemplo disso. Por lá, quando os funcionários deparam com um chefe recém-chegado que não os escuta, eles protestam. Como atuam por projeto de forma autônoma, os profissionais estão acostumados a participar da estratégia e organizar tarefas juntos.

    Grazi Mendes, diretora de pessoas, lembra-se de uma situação recente, na qual um empregado procurou o RH para falar a respeito de um líder autoritário, que não incluía as pessoas no processo decisório. O propósito dele, segundo a executiva, não era “queimar o filme” do chefe, mas ajudá-lo na adaptação à cultura da organização, horizontal e aberta.

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    Para solucionar o imbróglio, a empresa criou uma rede de apoio ao novo gestor. Além de mentoria com líderes veteranos, um dos empregados diretos dele se prontificou a atuar mais próximo, pon­tuan­do toda vez que ele agisse de modo inadequado. “O líder aceitou o acompanhamento do liderado e, inclusive, relatou que os feedbacks foram essenciais para a adaptação e o entendimento da cultura”, afirma Grazi.

    Os trabalhadores ainda criaram um relatório compartilhado de atividades, com atualizações frequentes de status, para mostrar que eram capazes. “Acredita-se muito na ideia de que, se as pessoas não forem vigiadas, não vão fazer o trabalho. Aqui, a gente parte da premissa de que, se dermos suporte e direcionamento, os resultados acontecem”, diz a executiva.

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    Mas o que leva um líder a se tornar tóxico? Ricardo Basaglia, direto-geral da Michael Page, explica que a maior parte das organizações carece de programas formais para capacitação de gestores. Assim, quando um chefe migra de posição ou deixa a companhia, dificilmente existe gente pronta — técnica e emocionalmente — para ocupar a função. “Em geral, os profissionais são promovidos num dia e assumem no outro. Ou seja, estão pouco preparados.” ­

    Embora seja difícil afirmar quando alguém está pronto para assumir uma posição, há características que evidenciam o potencial para gestão. “Pessoas com equilíbrio emocional, que sabem ouvir, fazer leitura de cenário e traduzir bem as diretrizes da organização, além de demonstrar interesse em se desenvolver, são fortes candidatas”, diz Ricardo.

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    Olhando para dentro

    Para minimizar a coerção, um dos primeiros passos é formar talentos internos, já adaptados à cultura. Esse é o caminho que as Lojas Renner, que obteve a maior nota em liderança deste Guia (97,8), percorre. Com um programa de sucessão que funciona há 12 anos, a companhia tem mapeados quem são os potenciais candidatos a ocupar posições de gerente sênior, gerente-geral e diretor. Para isso, além da avaliação de desempenho anual, a varejista aplica testes comportamentais para identificar quem possui — ou não — aptidão para liderar.

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    Os resultados são usados para a definição de uma lista de sucessores, que passa pelo crivo de um comitê de calibragem composto não só do chefe direto, mas de pares e colegas de outros departamentos. “Também fazemos uma avaliação, com consultoria externa, que valida se os profissionais têm, de fato, o potencial percebido dentro da organização e compara com referências de mercado”, diz Clarice Martins Costa, diretora de gente e desenvolvimento da Renner.

    Depois de cumprir essas etapas, a empresa chega a um inventário de sucessores e elabora um plano de ação para acelerar o desenvolvimento deles. O processo inclui a apresentação de desafios e tarefas mais complexas — que extrapolam a função atual — e a oferta de coaching, mentoring e uma série de treinamentos internos e externos.

    Hoje, todas as 87 posições estratégicas da organização possuem predecessores definidos. “É uma forma de manter nossa cultura, que é muito forte em gente”, diz Clarice.

    Mas nem todas as companhias têm a mesma realidade. Muitas, quando um chefe sai, correm para o mercado buscar outro. A recomendação, nesses casos, é contar com ferramentas que ajudem a minimizar erros de seleções.

    Além de assessment — questionário que avalia competências técnicas e comportamentais —, ajuda a realizar a contratação a avaliação 360°, em que os funcionários que serão liderados pelo candidato participam de uma das fases da entrevista.

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    Para os especialistas, incluir os empregados nesse processo traz resultados surpreendentes, afinal, eles conhecem a demanda da equipe com mais profundidade do que o próprio RH e podem fazer questionamentos assertivos, capazes de desnudar a mentalidade do futuro chefe. “O ritmo de trabalho, por exemplo, é algo que os membros do time conhecem melhor do que ninguém e podem questionar o candidato sobre como é o dele, para saber se está alinhado ao do grupo”, afirma Paulo, da Dom Cabral.

    Clarice Martins Costa, diretora de RH e desenvolvimento da Renner: a companhia faz mapeamento de sucessão para promover talentos aptos a gerir pessoas | Foto: Ricardo Jaeger ()

    Dia a dia

    As práticas para diminuir a incidência de dirigentes nefastos não devem parar na seleção. As corporações precisam adotar ferramentas cotidianas que estimulem a convivência saudável entre chefe e subordinado. Uma delas é naturalizar o feedback, encorajando quem possui cargos mais altos a pedir um retorno sincero sobre as próprias atitudes. Outra, tão ­importante quanto, é garantir que os líderes registrem a evolução de seus liderados e sejam ajuizados por eles nessa avaliação, evitando as famosas birras pessoais.

    Também é crucial investir em treinamentos que fortaleçam os dirigentes. O Sebrae Rio Grande do Norte, que teve uma incidência próxima de zero de chefes tóxicos (0,5%), fez isso. Em 2017, a empresa reuniu todos os gestores e questionou quais competências consideravam importantes aprimorar. Depois de definir algumas qualidades cruciais, a empresa estruturou uma capacitação, em parceria com a Fundação Getulio Vargas, com duração de dois anos.

    A primeira fase do curso, finalizada neste ano, capacitou 25 gerentes, que tiveram treinamentos online e presencial sobre comunicação positiva; liderança coach; negociação e administração de conflitos; gestão de equipes eficazes; criatividade e inovação.

    A iniciativa já tem trazido resultados: o nível de satisfação com a chefia saltou de 83%, em 2014, para 98,3% em 2019. “Ganhamos celeridade na resolução de problemas e conflitos, já que muitas situações passaram a ser resolvidas diretamente entre chefes e times, sem a ingerência da diretoria, por exemplo”, diz Simone Galvão, gerente de RH do Sebrae Rio Grande do Norte. A empresa já estuda uma segunda rodada de capacitações para 2020, com data ainda a ser definida.

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    Simone Galvão, gerente de gestão de pessoas do Sebrae Rio Grande do Norte: 24 gerentes estão sendo treinados em temas como comunicação positiva, coach, negociação e gestão de equipes eficazes | Foto: Humberto Lopes ()

    Constância

    Nem sempre é fácil identificar a presença de um gestor que não está agradando. Por isso, a indicação dos especialistas é que as companhias adotem ferramentas que meçam, constantemente, o ânimo do pessoal. Funciona realizar pesquisas pulse, rápidas e pontuais, específicas sobre a atuação da liderança. “Levantar esses dados é uma maneira de ler o clima organizacional e identificar as áreas onde há pontos sensíveis”, afirma Paulo, professor da Fundação Dom Cabral.

    A Renner aplica pesquisas de engajamento todos os anos e delega aos BPs (businnes partners) das 18 regionais a missão de organizar reuniões com lideranças e equipes para apresentar dados coletados e estruturar os planos de ação necessários para corrigir eventuais problemas detectados.

    Com o uso da ferramenta, a empresa conseguiu identificar, por exemplo, que funcionários de determinado departamento não estavam confortáveis com o modo com que o chefe cobrava resultados, considerado muito agressivo. Para reverter a situação, o RH atuou diretamente com o líder, propondo a ele uma mentoria com outro profissional da organização que se destacava nos pontos que ele precisava aperfeiçoar.

    O engajamento da equipe aumentou em 20% depois da ação. “No primeiro mês, após conversas com a equipe, detectamos uma melhora no engajamento. Muitas vezes, são questões simples de resolver. Basta ouvir os funcionários”, diz Clarice, executiva de recursos humanos da Renner.

    E o que não faltam são ferramentas para dar voz aos profissionais. Hoje, se a companhia quiser, ela consegue monitorar o clima diariamente com aplicativos de celular, que permitem o feedback dos profissionais em tempo real. “Antes, reclamava-se da demora das pesquisas de clima tradicionais.

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    Quando pensava em solucionar um problema, outros surgiam. Com a chegada da tecnologia, esse tipo de dificuldade não existe mais”, diz Ricardo, da Michael Page. Com tantos recursos, é injustificável permitir que o mau comportamento de um chefe ponha em risco a saúde das pessoas — e do negócio.


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