Empresas precisam planejar as mudanças de endereço
Muitas companhias buscam um novo endereço de olho na renegociação do aluguel, mas a mudança precisa ser planejada para não comprometer a operação
Mais de 200 empresas trocaram de endereço no Brasil até setembro, segundo um estudo feito pela Engebanc, assessoria imobiliária voltada para o mercado corporativo. (No ano passado inteiro, foram 300 companhias arrumando as caixas.) Uma das razões da movimentação é a renegociação do preço do aluguel. Nos últimos cinco anos, o custo da locação em prédios categoria B+/B caiu 26%, enquanto a mensalidade para os de classe A+/A despencou quase 40% em São Paulo.
Algumas regiões da cidade, por exemplo, se tornaram bastante atraentes. Para Marcelo Santos, CEO da Engebanc, é o caso da zona sul: levando em consideração a estrutura e as facilidades oferecidas pelos edifícios, o valor cobrado está baixo.
Se a motivação da mudança for financeira, Santos acredita que essa é a hora de encaixotar os pertences, chamar o caminhão e se mexer. Mas, independentemente da razão, a área de recursos humanos precisa tomar alguns cuidados.
O primeiro é ter uma boa justificativa para a troca. Afinal, “o local impacta na credibilidade que é passada para o cliente”, diz o especialista. O segundo é a preservação da mão de obra. “Se a companhia está na zona oeste de São Paulo e a maioria dos empregados mora nessa região, ao optar por um novo bairro, na zona sul, certamente ela perderá funcionários.” O terceiro ponto é descobrir o preço do aluguel durante a alta. Ao primeiro sinal de retomada econômica, o proprietário vai chamar o locatário para renegociar o desconto cedido durante a crise. “Se a empresa conseguir pagar o valor real, pode se transferir. Caso contrário, é melhor evitar.”
Seja para reduzir despesas, seja por benefícios fiscais, seja para acomodar a mão de obra que aumentou, a recomendação é que a decisão não seja tomada por impulso. “A mudança deve ser consistente hoje e daqui cinco, 20 anos”, afirma Marcelo Santos.
Confira os casos de quatro companhias que atualizaram o CEP recentemente.
Visão além do alcance
Quando a desenvolvedora de software para o varejo Linx fez sua primeira pesquisa de clima, descobriu que os funcionários estavam insatisfeitos com a localização do escritório.
A companhia ocupava 14 andares na Rua Cenno Sbrighi, no distrito da Barra Funda, em São Paulo — uma região escassa de restaurantes, deserta à noite e com diversos problemas de segurança. “O endereço trazia alguns desconfortos: não tinha acesso fácil de transporte público e gerava uma sensação de insegurança”, afirma Flavio Menezes, vice-presidente de marketing e RH da Linx. Unindo o resultado da avaliação à necessidade de acomodar os 1 076 empregados num único espaço, mais a boa fase do negócio — de 2015 a 2016 a receita operacional da empresa aumentou 13% —, a Linx resolveu trocar de lugar.
Ao analisar onde morava a maioria dos empregados, a área de recursos humanos concluiu que o melhor posicionamento seria na zona oeste da capital paulista. A decisão pelos cinco andares no edifício em Pinheiros, ao lado da Marginal, levou em conta a proximidade com as estações de metrô, ônibus e trem.
Tudo aconteceu rapidamente: da busca pelo novo prédio, em 2016, até a reforma do espaço, finalizada em janeiro de 2017, se passaram três meses. Nesse período, o time de RH investiu na comunicação para preparar o pessoal. “Fizemos um comunicado individual para todos os líderes, e eu apresentei o projeto. Depois, iniciamos a campanha sobre a mudança da sede”, diz. Foi criado um site com informações sobre a transferência, e e-mails sobre o andamento da obra eram enviados com frequência. “Trouxemos alguns profissionais durante a reforma para que eles vissem como o escritório ficaria usando óculos de realidade aumentada.” Em maio, o pessoal já estava nas novas mesas — e a Linx não perdeu nenhum funcionário.
A empresa-satélite
Desde quando se tornou independente da Gol, a empresa de programas de fidelidade Smiles já trocou duas vezes de escritório. A primeira aconteceu em 2013, quando saiu do Aeroporto de Congonhas para a região da Berrini, na zona sul de São Paulo; a segunda, em 2014, significou a ida para Alphaville, bairro das cidades de Barueri e Santana de Parnaíba. A decisão foi tomada depois de uma pesquisa apontar que os 60 funcionários na época residiam nas zonas sul e oeste da capital paulista e até em cidades próximas, como Jundiaí, Sorocaba e Osasco — teoricamente, regiões com fácil acesso até a nova casa.
Mesmo assim, a Smiles passou a pagar integralmente o custo de fretados usados pelos empregados (um profissional vai de Santos, no litoral sul de São Paulo, a Alphaville) e, para quem prefere ir com carro próprio, a reembolsar o valor do pedágio e oferecer vale-combustível. “Quando viemos para cá, tivemos medo de perder alguém por causa da distância e da localização”, diz Juliana Pinho, líder de recursos humanos da Smiles. Mas não foi o que aconteceu: nenhum empregado pediu demissão da empresa, pelo contrário. “As pessoas gostaram tanto da região que acabaram se mudando para cá.” Hoje, a Smiles conta com 130 profissionais — mas o espaço, garante a RH, ainda comporta o pessoal.
Reaproveitando as persianas
Com a queda das vendas no setor de construção, a Mexichem, mais conhecida por sua marca de tubos e conexões Amanco, precisava economizar. Como não houve negociação no valor do aluguel no condomínio Rochaverá, na zona sul de São Paulo, a companhia decidiu buscar outro espaço.
Para isso, algumas questões seriam levadas em consideração. Primeiro, o endereço continuaria na zona sul, uma vez que metade dos funcionários morava por ali. Segundo, o prédio deveria ser de fácil acesso por transporte público.
Adriana Garcia, diretora de recursos humanos da Mexichem, selecionou algumas opções: tirou o salto, calçou o tênis e fez o trajeto que os empregados teriam de fazer para cada um dos prováveis edifícios, considerando o transporte público. Para ela, era importante calcular o tempo que o trabalhador levaria para chegar à empresa depois da mudança.
O antigo endereço estava próximo da estação de trem Morumbi; já o local escolhido (o condomínio Headquarters) fica perto da estação Jurubatuba — três paradas a mais do que o pessoal estava acostumado, o que acrescenta 15 minutos na viagem. Além da facilidade de acesso, o novo espaço, com 1 400 metros quadrados, menor do que o antigo, tem aluguel três vezes mais em conta.
Outro ponto que contou a favor do edifício: a altura do teto, o tamanho das janelas e das portas, tudo é parecido com o antigo escritório. Com isso, a Mexichem conseguiu reutilizar os móveis e as cortinas, economizando, também, na reforma e na decoração.
A única desvantagem do novo endereço, segundo Adriana, é o fato de a empresa ainda estar sozinha numa das torres do condomínio. “Quando você compartilha o espaço com outras organizações, consegue dividir alguns custos, como o da van que leva os funcionários para a estação”.
Do limão, uma caipirinha
Faz dois meses que a Schneider Electric, fornecedora de produtos e serviços para distribuição elétrica, transferiu o escritório para o espaço de uma antiga fábrica em Jurubatuba, na zona sul de São Paulo. Como o prédio era próprio, a diretoria entendeu que a economia com o aluguel compensaria os 6 quilômetros a mais do antigo endereço, em Santo Amaro. Malena Martelli, vice-presidente de RH, ficou encarregada de comandar o processo.
Para isso, formou um grupo com mais 12 pessoas das áreas financeira, jurídica, de comunicação e de facilities. “Nos encontrávamos todas as segundas-feiras para discutir o que estava acontecendo”, diz. Para tirar o ranço de que Jurubatuba era longe, o projeto foi batizado de Jump (“pulo”, na tradução do inglês). A frase foi dita por Malena em uma das reuniões: “Sair de Santo Amaro para Jurubatuba é um pulo”. A campanha era representada por um guarda-chuva e, embaixo dele, ficavam as iniciativas de gestão de pessoas, como flexibilidade de horário e carona solidária entre os funcionários.
A mudança aconteceu em cinco meses. A equipe de recursos humanos foi a primeira a chegar ao novo local, antes mesmo de a reforma começar. “O RH veio antes para garantir que as condições de trabalho de quem estava aqui fossem respeitadas”, afirma a executiva.
As obras continuam até hoje no ambiente de 9 000 metros quadrados, mas a Schneider já conseguiu economizar o dinheiro do aluguel e acabar com a ociosidade do antigo galpão. O novo espaço tem uma sala de cochilo, outra de música e uma terceira destinada à leitura, tudo à disposição dos 500 empregados. “O pessoal brincava que a gente ia fazer do limão uma limonada, mas o resultado foi tão bom que fizemos uma caipirinha”.