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Comportamento nas redes sociais: um campo minado

É difícil acompanhar o que os funcionários publicam. Para evitar danos à imagem da empresa, a solução é elaborar um manual de boas práticas online. Veja como.

Por Pâmela Carbonari
Atualizado em 4 out 2024, 15h38 - Publicado em 2 out 2024, 16h04
Ilustração de um jogo de tabuleiro quadriculado contendo números e ícones variados.
 (Cajila Barbosa/VOCÊ RH)
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O perigo já começa quando dá aquela coceirinha nos dedos. A vontade de reclamar do chefe, de expor um gerente, de xingar um colega. O post pode até nem ser tão explícito, mas vem carregado com aquele “entendedores entenderão”, e aí todo o círculo social da pessoa capta a mensagem – e o nome da empresa fica manchado. Quem vai querer dedicar 44 horas semanais em um lugar desses? Ou mesmo colaborar ocasionalmente com uma empresa assim? Surgem trincos e arranhões na marca empregadora.

Quando a exposição é de algo mais grave, nem se fala. Em 2017, Susan Fowler, uma engenheira de software de 26 anos, escreveu sobre a cultura de assédio sexual na empresa em que trabalhava, então uma queridinha do Vale do Silício: a Uber. Foi um terremoto que causou contratos rompidos, reputação maculada e demissões de executivos, incluindo até o CEO, Travis Kalanick. Susan tinha levado o caso ao RH antes, mas, como acontece tantas e tantas vezes, não deram muita importância. 

Seja no caso dela, que foi vítima, seja no caso de um post aparentemente inofensivo, mas que acaba tornando público, por exemplo, um dado sensível, as empresas precisam estar atentas ao que seus funcionários andam falando delas pelas costas – ou melhor, nas redes sociais. O desafio é promover o bom senso sem instaurar um clima de paranoia e censura.

Ilustração de rapaz caminhando num tabuleiro quadriculado com números, segurando um smartphone, indo em direção de uma bomba.
O Brasil é o terceiro país que mais usa redes sociais no mundo. [Imagem: Cajila Barbosa/Você RH.] (Cajila Barbosa/VOCÊ RH)

Uma extensão da vida

O Brasil é o terceiro país que mais usa redes sociais no mundo, segundo a Comscore. É natural, para milhões de pessoas, narrar ou mostrar a própria vida todos os dias na internet, o que inclui, às vezes, falar de chefes, colegas etc. Por isso mesmo, as redes acabam sendo uma extensão do ambiente de trabalho.

“Não é incomum que os funcionários postem situações cotidianas que vivenciaram, como entregas de projetos, elogios de clientes, comemorações, reconhecimentos”, diz Ana Gusmão, diretora de gente da consultoria Falconi. O problema aparece quando eles “expõem clientes, outros funcionários, situações desagradáveis vividas com gestores, times ou pares, entre tantas outras”, exemplifica.

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As consequências são as mais variadas, segundo as fontes consultadas pela Você RH. “Uma simples postagem pode causar danos à reputação da organização, perda de clientes ou negócios e ruídos na relação com parceiros”, diz Ana. Para Lúcia Menezes Cotes, diretora de gestão de pessoas da Passarelli Engenharia, de São Paulo, a depender do conteúdo, o post pode impactar o relacionamento com stakeholders e o valor de mercado da empresa.

Já Ricardo Basaglia, CEO da consultoria Michael Page no Brasil, lembra do prejuízo à imagem da marca empregadora. “Vira uma dificuldade para encontrar novos talentos. Ninguém quer trabalhar onde os funcionários falam mal”, diz. A influenciadora Ana Letícia Magá, mentora de carreira focada na geração Z e criadora do canal FuturAna, enfatiza os problemas capazes de surgir quando um post negativo viraliza. “A exposição pública pode acarretar processos judiciais, investigações governamentais e alta rotatividade de funcionários.” 

Às vezes, um ambiente de trabalho pode ser tão tóxico que suas histórias viralizam sem nem precisar de redes sociais: circulam por e-mail, como se estivéssemos nos anos 2000. 

O advogado especialista em direito do trabalho Lucas Wright, do escritório Catelan Rodrigues, sugere que a melhor maneira de evitar que um post acabe virando uma dor de cabeça de tribunal é ter uma política interna sólida e bem-divulgada, com um manual adequado ao modelo de negócio e ao perfil da empresa, feito em conjunto pelo RH e o departamento jurídico.

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Ana Gusmão concorda, mas lembra que a criação desse manual é um desafio considerável. “O maior dilema enfrentado pelas organizações é o receio de serem invasivas ou acusadas de cercearem a liberdade de expressão de seus funcionários, o que, por vezes, faz com que elas decidam não tomar nenhuma medida efetiva.”

Para a executiva, envolver os funcionários na construção e atualização das diretrizes, promover treinamentos com linguagem simples e recheados de exemplos práticos, mostrar a importância do bom comportamento online para a empresa e os funcionários, e manter canais abertos para feedback e sugestões são o melhor caminho. Além disso, vale a pena falar de privacidade, “para destacar a importância de não compartilhar informações confidenciais da organização”, afirma.

Ricardo Basaglia reforça a necessidade de trazer os funcionários para o debate. “A participação gera comprometimento. O foco é educar sobre consequências, não sobre punições. Conscientização é sempre mais eficaz que medo.”

Ilustração de rapaz num tabuleiro quadriculado com números, rodeados de bombas, recebendo instruções de um segundo rapaz.
O prejuízo à imagem da empresa vira uma dificuldade para encontrar novos talentos. [Imagem: Cajila Barbosa/Você RH.] (Cajila Barbosa/VOCÊ RH)
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Como usar as redes a favor da empresa

Além desse treinamento, é válido reforçar os canais de comunicação existentes na organização – ou até mesmo criar novos. Para Ana Letícia Magá, espaços de compliance para as pessoas poderem relatar preocupações ou informar sobre possíveis problemas ajudam a reduzir o impacto das crises.

Ana Gusmão tem a mesma opinião: “Um ambiente de trabalho saudável e espaços onde os funcionários se sintam seguros para expor opiniões ainda são as melhores estratégias”, diz. “Muitos dos temas tratados em publicações no LinkedIn poderiam ser resolvidos em conversas transparentes entre líderes e liderados”, resume Lúcia Cotes.

Todos os especialistas ouvidos concordam que proibir ou restringir o uso de redes sociais é um atalho para mais problemas. “Na prática, é difícil controlar o que os funcionários postam em suas contas pessoais, e isso ainda pode levar a problemas de confiança, com hipervigilância e um ambiente de trabalho restritivo”, explica Ana Letícia.

Ricardo também acredita nisso: “Proibir pode ser o caminho mais curto para a rebeldia. Controlar redes sociais é como tentar segurar a água com as mãos”. Além disso, como lembra Lúcia, ao sair da empresa, o ex-funcionário estará livre para postar à vontade – e descarregar uma possível raiva represada contra os antigos chefes.

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Por outro lado, as organizações podem estimular um uso das redes que seja benéfico para elas. “Muitas vêm apostando em boas alternativas, como programas de embaixadores da marca e uso de hashtags específicas”, exemplifica Ana, da Falconi. Ricardo, CEO da Michael Page, lembra que funcionários satisfeitos são os melhores divulgadores de uma marca. “Cultura forte fala mais alto que qualquer regra rígida.”

Se a ânsia dos brasileiros por estarem nas redes o tempo todo é uma armadilha em potencial, ela também pode ser usada a favor das empresas, diz a mentora Ana Letícia. “A naturalidade com essas plataformas facilita a implementação de treinamentos. Como muitos funcionários já são familiarizados com as redes, é fácil engajá-los e educá-los sobre as melhores práticas.”

Ainda assim, por mais bem estabelecido que esteja esse código de conduta, as empresas não devem abrir mão de ter um plano para lidar com esses problemas – e pronto para ser colocado em funcionamento. “Prevenir sempre sai mais barato, e quem não responder rapidamente a uma crise no digital pode pagar caro demais”, diz Ricardo Basaglia. 

E é isso mesmo: no campo minado das redes sociais, minutos podem fazer a diferença entre um problema simples de resolver e uma catástrofe. Então vale demais ajudar seus colaboradores a evitar esse passo em falso – capaz de explodir a imagem de uma empresa que, talvez, só seja ruim na tela de um celular raivoso.

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CUIDADOS AO USAR O PERFIL PROFISSIONAL DA EMPRESA

Estas regrinhas ajudam a evitar dor de cabeça ao administrar as redes oficiais da marca.

  1. Pense e reflita. Toda postagem deve ser condizente com a visão e as estratégias de marketing da empresa. Redes sociais são, muitas vezes, a voz mais poderosa de uma marca.
  2. Atenção com as informações divulgadas. Ao compartilhar links externos, certifique-se de que sejam de fontes confiáveis. Tenha cuidado também para não usar conteúdo com direitos autorais protegidos.
  3. Cuidados com dados sensíveis. Evite revelar dados pessoais (seus ou de colegas) e fique atento para não postar números ou dados confidenciais da empresa.
  4. Na dúvida, consulte os colegas. Ao fazer um post sobre algo que não é da sua área, fale antes com colegas mais familiarizados com o tema. Envolva-os nas discussões a respeito nas redes sociais e em eventuais contatos com a mídia.

Esta matéria é parte da edição 94 (outubro/novembro) da Você RH. Clique aqui para conferir outros conteúdos da revista impressa.

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