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Efeito da pandemia: como envolver os funcionários em causas filantrópicas

A crise da covid-19 estimulou as empresas a terem uma atuação filantrópica mais forte. Saiba quais são os cuidados e como engajar os funcionários

Por Paula Simões
Atualizado em 26 out 2021, 14h57 - Publicado em 20 ago 2021, 07h00

Esta reportagem faz parte da edição 75 (agosto/setembro) de VOCÊ RH

Diante da crise econômica e sanitária que se alastrou pelo país como consequência da pandemia de covid-19, diversas empresas entenderam que não podem ficar à margem dos problemas sociais e precisam agir. Isso fez surgir uma onda de ações filantrópicas em companhias de diferentes setores. De acordo com o Monitor das Doações, acompanhamento feito pela Associação Brasileira de Captadores de Recursos que reúne dados de doadores de todo o país, em julho já haviam sido arrecadados mais de 7 milhões de reais em ações de resposta ao cenário atual.

Essa é uma virada no comportamento dos brasileiros — e das companhias que atuam no país. Para Priscila Pasqualin, advogada especialista em terceiro setor e sócia do PLKC Advogados, a pandemia gerou uma consciência maior sobre os problemas sociais complexos que o Brasil possui. Isso pode ser visto pela tendência de companhias estruturarem setores de responsabilidade social de maneira organizada, estarem mais preocupadas com as estratégias ESG (de responsabilidade ambiental, social e de governança) e em alinhar essas ações ao posicionamento estratégico. “Esse tipo de atuação passa a ser uma exigência dos próprios consumidores e funcionários”, diz Priscila.

A participação em doações e ações de filantropia pode ocorrer por meio das leis de incentivo fiscal — que estimulam essas ações com a redução do pagamento de impostos. “São mecanismos importantes de fomento à cultura de doação no país, além de serem ferramentas poderosas para as organizações sem fins lucrativos que buscam captação de recursos privados”, diz Flavia Regina Oliveira, especializada em negócios sociais no escritório de advocacia Mattos Filho.

Aumentando o escopo

Entre os 453 doadores corporativos acompanhados pelo Monitor das Doações, a JBS ocupa uma posição de destaque: é a terceira companhia que mais doou durante a crise da covid-19. É por meio do programa Fazer o Bem Faz Bem que a fabricante de proteína animal estrutura suas ações — e o projeto recebeu um aporte de 400 milhões de reais em 2020 feito inteiramente do caixa da empresa e voltado também para ações relacionadas às consequências da covid-19. O projeto existe desde 2019 e tem como objetivo auxiliar comunidades nas quais a JBS atua. O combate à fome é um dos pilares, e a empresa tem parceria com a ONG Amigos do Bem, que organiza doações de alimentos para o sertão nordestino.

“Com a pandemia, identificamos a necessidade de fazer mais. Vimos que nosso papel na comunidade seria fundamental e por isso intensificamos nossa participação”, diz Fernando Meller, diretor de gente & gestão da Seara e gestor do programa Fazer o Bem Faz Bem do Grupo JBS. Para isso, a empresa se dividiu em três frentes: auxílio ao combate ao novo coronavírus (com doações para hospitais para compra de equipamentos e contratação de profissionais da saúde), combate à fome em locais em que a JBS não tem unidades e apoio à pesquisa. “Destinamos recursos a 39 pesquisas científicas que buscam tratamento e desenvolvimento de vacinas para a covid-19”, diz Fernando.

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Um comitê de profissionais especializados foi criado para encontrar as melhores maneiras de doar, e os funcionários da JBS participaram das iniciativas desde o início — seja com sugestões de ações a serem realizadas, seja com a entrega de doações nas comunidades. “Tivemos relatos muito emocionantes das equipes envolvidas. Para eles, era especialmente gratificante participar dessa ajuda, porque estavam vivendo as realidades desses municípios”, afirma Fernando.

Olhar para dentro

Engajar os funcionários em práticas de responsabilidade social, no entanto, não é uma tarefa tão simples quanto parece. Antes de iniciar qualquer tipo de mobilização, as empresas precisam atentar para o tipo de cultura que constroem internamente. “Fica incoerente quando a companhia cria uma campanha externa, muito embora justíssima, mas dentro o indivíduo vive modelos de gestão centrados no medo, na punição, no ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’”, alerta o professor Anderson Sant’Anna, da FGV-Eaesp.

É por essa razão que olhar para dentro é tão importante. Quem tem feito isso é a Serasa Experian, que em 2021 lançou o Fundo ALMA no Brasil. A ação, que já existia em outros países em que a empresa atua, organiza doações de funcionários e da própria empresa em um fundo destinado a empregados que precisem de auxílio financeiro diante de situações de vulnerabilidade, como desastre natural, violência doméstica, despejo, acidente, doenças, perda do responsável pelo sustento da família, entre outros casos. Na pandemia, a principal motivação dos funcionários que recorreram à ajuda eram dificuldades relacionadas a problemas de saúde no âmbito familiar.

“O fundo aconteceria no Brasil independentemente da pandemia. Sempre tivemos momentos em que nossos funcionários precisaram desse tipo de ajuda. Em casos de enchente, desabamento ou relacionados a questões de saúde que o plano não cobre, como adaptação da residência em uma amputação ou por causa de familiares idosos”, diz Flávio Balestrin, vice-presidente de recursos humanos da Serasa Experian. Porém, a empresa deparou com um problema cultural na hora de criar o programa: não havia no Brasil nenhuma organização que trabalhasse como gerenciadora de fundos de doações de pessoas jurídicas e que também atuasse como agente reguladora — uma vez que a destinação desses recursos acontece de forma independente e anônima, sem intervenção da empresa. “Nós fomos o primeiro caso de uma companhia internacional que passou a atuar no Brasil a partir da nossa demanda”, explica Flávio.

Superados os desafios burocráticos, os resultados impressionaram a Serasa. Já foram arrecadados mais de 500.000 reais para o fundo, sendo metade desse valor doado pela própria companhia. A arrecadação acontece durante todo o ano, e Flávio aponta que um momento como este tem tornado as pessoas mais sensíveis em participar. Há três maneiras de doar: valor fixo descontado no contracheque, doação pontual por desconto em folha de pagamentos e também por QR code que direciona para um pagamento via PayPal. Todo trimestre os funcionários recebem um relatório do fundo com a prestação de contas sobre a utilização dos recursos, mas preservando o anonimato de quem recebeu a ajuda. “As pessoas aderem quando sentem que a proposta é realmente legal”, explica Flávio.

Sensação de pertencimento

Além de ajudarem quem precisa, as ações de responsabilidade social corporativas trazem sentimentos importantes às equipes, como sensação de pertencimento à companhia em que trabalham e de voz ativa na solução de problemas sociais. “As ações têm mais impacto positivo se conseguem dar protagonismo para os funcionários”, diz a advogada especialista em terceiro setor Priscila Pasqualin. “Quanto mais genuína a ação da empresa e mais aberta para o envolvimento de todos no processo, mais pessoas se engajam na causa.”

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A Mazars, multinacional de serviços contábeis, viu esse engajamento aparecer naturalmente entre seus líderes que, na pandemia, começaram a propor ações filantrópicas durante reuniões de engajamento e integração das equipes. Daí surgiram projetos para arrecadação de alimentos e materiais para instituições carentes e doação de sangue. Um dos setores da companhia, por exemplo, conseguiu meia tonelada de comida, 150 litros de leite e seis doações de sangue. “Em nenhum momento propusemos aos gestores que as ações de integração envolvessem algum tipo de atividade filantrópica. Isso partiu das equipes e das necessidades que estão sentindo neste momento”, diz Milena Bizzarri, diretora de RH da Mazars. Institucionalmente, a empresa também criou em 2021 o programa AMAR, que recebe doações dos funcionários e aportes da própria compahia para destinar às organizações Apadrinhe um Sorriso, de ações educacionais para crianças e jovens carentes da comunidade Parque das Missões, em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, e Instituto Baccarelli, que leva educação musical clássica para crianças e jovens da comunidade de Heliópolis, em São Paulo. Até o momento foram arrecadados 70.000 reais.

Cuidados importantes

Empresas que se engajam em causas filantrópicas precisam atentar para alguns pontos. O primeiro é o cuidado com o direcionamento dos recursos, que devem ser eticamente alocados em instituições sérias e responsáveis. Além disso, é preciso transparência para comunicar periodicamente sobre as ações e os resultados delas aos funcionários e stakeholders.

Do ponto de vista de gestão de pessoas, os projetos devem ser desenhados para gerar engajamento e colaboração, e não competição ou constrangimento. A companhia precisa respeitar a individualidade de cada funcionário na escolha de aderir ao projeto ou não. Afinal, a situação financeira de cada um é privada e nem todos têm condições de doar. “A coação seria o ato de exercer pressão psicológica ou constrangimento ao indivíduo com o objetivo de fazê-lo praticar algo que não deseja”, explica o advogado Thiago Sombra, sócio da prática de compliance e ética corporativa do escritório de advocacia Mattos Filho.

Por isso, é importante deixar claro que a participação não é obrigatória e, se houver ações de incentivo, nunca as atrelar a aspectos que prejudiquem o profissional — como feedback negativo na avaliação de desempenho, exclusão do funcionário de um grupo de trabalho ou divulgação dos empregados que não aderiram. Lembre-se: o cuidado começa dentro de casa, e o engajamento com a causa filantrópica só acontece genuinamente quando é voluntário.

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