Este texto foi publicado na edição 68 de VOCÊ RH
O assassinato brutal de um negro por um policial branco nos Estados Unidos no fim de maio gerou uma onda histórica de protestos e trouxe à tona uma conversa que provoca grande incômodo em nossa sociedade. Como, afinal, ainda convivemos com tamanho racismo estrutural fingindo que ele não existe?
No mundo empresarial, embora haja cobrança de parte da sociedade para uma mudança, a dificuldade de navegar por esse tema é evidente. A inclusão racial entrou de maneira mais forte na publicidade nos últimos anos, porém os esforços para ampliar o número de negros em cargos de gestão ainda são irrisórios quando comparados a movimentos para ampliação do percentual de mulheres na liderança, por exemplo.
A explicação é simples: devido a um passivo histórico vindo dos tempos da escravidão, a inclusão racial esbarra nos altos índices de desigualdade social — e promover mudanças nesse sentido demanda muito mais esforço e investimento. Além disso, temos de admitir que o preconceito contra negros no Brasil é ainda muito maior do que se imagina.
Um levantamento feito pelo Instituto Ethos com as 500 maiores organizações brasileiras mostra que os negros ocupam apenas 4,7% dos cargos executivos e 6,3% dos cargos gerenciais — sendo que mais da metade da população brasileira é preta ou parda. Se não houver um apoio das altas lideranças para tornar a inclusão racial uma política, ou se não houver uma imposição de política afirmativa, dificilmente algo concreto irá acontecer.
A pesquisadora e consultora americana Kira Hudson Banks, especializada em estudar a experiência do impacto da discriminação na saúde mental e em relações sociais, indica três ações importantes para as empresas que desejam de fato proporcionar um ambiente inclusivo. E nisso os profissionais de recursos humanos podem ter grande influência.
A primeira delas é fazer da inclusão racial um investimento de longo prazo, não se restringindo a conversas esparsas sobre racismo — uma palestra sobre viés inconsciente é um começo importante, mas não pode ser a única iniciativa. Treinamentos customizados e discussões regulares, segundo a pesquisadora, fazem com que os funcionários entendam a diversidade como valor da companhia e percebam que ela também gera valor e inovações para o negócio.
A segunda atitude recomendada por Kira é: abrace e reformule os conflitos. Em vez de reagir com surpresa diante de conflitos raciais, espere por eles e, para solucioná-los, apoie-se em habilidades de gestão que incluam escutar, reconhecer e refletir sobre como as identidades pessoais e sociais podem influenciar tais interações.
Em terceiro lugar, a pesquisadora sugere que a organização seja proativa com relação aos esforços de inclusão. Pergunte aos funcionários negros, de forma construtiva, como eles enxergam que a raça influencia sua experiência na companhia. Questione quais são seus maiores obstáculos na organização e de que forma a gestão pode ajudá-los. E, para fechar, pergunte se eles sentem que processos de mentoria e promoção são realizados com ou sem vieses.
Eu adoraria ver, ainda, a inclusão de negros em conselhos de administração. Certamente isso fará uma enorme diferença na mudança que eu gostaria de estar viva para presenciar.
*Psicóloga, sócia da Vicky Bloch Associados e professora nos cursos de especialização em RH da FGV-SP e da FIA