ompreender um mundo cada vez mais complexo, promover interações significativas, evidenciar a importância da diversidade, compartilhar os mais diferentes conhecimentos e unir algumas das mentes mais inspiradoras do mundo. Este é o espírito do SXSW (South by Southwest), que acontece anualmente em Austin há mais de 30 anos e se firmou como um dos principais eventos de inovação da atualidade.
Essa foi minha 2ª jornada ao SXSW (minhas percepções do ano passado estão aqui). Quando decidi retornar, este ano, já estava convicto de que o que veria por lá ajudaria a embasar, direcionar e fortalecer as estratégias culturais que desenvolvemos com nossos clientes. E, além do conteúdo em si, milhares de pessoas querendo ajudar o mundo a evoluir geram uma energia incrível, que eleva o papel de empreendedores, empresários, executivos, líderes e gestores.
Ok, admito certo “bode” quando estou em ambientes em que o futuro desejado atropela a realidade. Sou curioso, e quero saber como. Por isso mesmo creio que uma das palestras que mais me impactou esse ano foi sobre uma palavra conhecida e difícil de traduzir para o português: accountability.
O Google traduz o termo como “responsabilidade”. Quem vai mais fundo na busca encontra a expressão “prestação de contas”. Se continuar, palavras como “controle”, “responsabilização”, “compromisso”, “proatividade” e “transparência” também vão surgir na tentativa de definir o conceito. Resumindo, accountability nada mais é do que a obrigação de assumirmos a responsabilidade sobre nossas próprias ações.
Hoje quero compartilhar a visão que Rheet Power, uma das maiores autoridades do mundo em Cultura de Accountability, trouxe ao SXSW. Organizações como o Banco Mundial, United Airlines, Virgin America, McDonald’s, são algumas onde ele ajudou a introjetar este valor como força central da cultura corporativa.
Em que contexto essa discussão surgiu em um encontro de inovação? Hoje, mais de 90% dos trabalhadores americanos não acreditam que suas empresas (e, consequentemente, seus líderes, funcionários e até eles mesmos) vivenciem accountability como parte de sua cultura.
Essa percepção gera consequências que todos nós já vimos: pouca clareza dos objetivos da empresa e dos entregáveis individuais. Ausência de um propósito compartilhado e grupos que chegam a ter seus próprios códigos culturais. Grande distância entre os funcionários e os indicadores-chave de negócios. Gerentes menos pensantes, que delegam para cima e evitam o conflito construtivo. E os sintomas dessa doença não param por aí: baixo engajamento, baixa produtividade, alto nível de entropia, pouco espaço para a inovação e falta de atratividade intelectual contribuem para esse quadro grave.
Como pessoas formam um time e os times formam uma empresa, em um ambiente onde o indivíduo não tem accountability não existem times. Existem “grupelhos”. Para piorar, o sistema retroalimenta aspectos negativos da cultura, como comunicação sem transparência, infantilização da liderança, priorização de agendas pessoais em detrimento da agenda corporativa, e pouca integração entre áreas. Ou seja, gente sem accountability faz fofoca, é egoísta, ciumenta e, para piorar, ainda atrai mais gente que não joga em equipe.
É possível mudar esses comportamentos? Sim, se houver esforço para isso. Uma crença vira atitude quando gera uma mudança de comportamento, e essa mudança se torna realidade a partir da repetição e da rotina. Assim, uma cultura de accountability só se desenvolve se algumas disciplinas forem vivenciadas:
- Colocar esforço e manter a diligência todos os dias;
- Ficar desconfortável e confiar nas suas convicções;
- Aceitar as próprias vulnerabilidades e as dos outros;
- Investir tempo e recursos em uma jornada de transformação cultural.
Quando se transforma o valor de accountability num sistema cultural, isso permite mudanças das quais as empresas se beneficiam de forma inigualável. Ela garante que cada membro do time tenha clareza da raia em que está nadando. Define prioridades, em um ambiente que se transforma em alta velocidade. Permite alinhar cultura com estratégia de negócios, a partir de processos claros de mensuração de resultados. Dá a todos os membros do time visibilidade do resultado e das perspectivas da empresa, assim como reforça o papel de cada indivíduo na busca de um propósito comum. Garante que os colaboradores não estejam desmotivados — pelo contrário, promove um ambiente de automotivação. A jornada do accountability não é diferente de qualquer jornada cultural. Exige tempo, empenho, humildade intelectual e as ferramentas e metodologias corretas. Uma cultura fundamentada nesses moldes é o que Rheet chama de “got your back culture” (em contraponto à expressão “watch your back ”).
Finalmente, Rheet lista 5 Cs que dão o caminho para tornar qualquer cultura accountable:
- Common purpose: um propósito comum para toda a organização.
- Clareza: das metas, dos comportamentos, das entregas necessárias e dos indicadores-chave
- Colaboração e coaching: sempre com intenções positivas.
- Comunicação: transparência para encarar “the brutal facts”.
- Comprometimento, coragem e disciplina de implementação.
Mas atenção: para plantar uma cultura que gere vantagem competitiva e colher protagonismo, os líderes cada vez mais precisarão não apenas ter coragem, mas também ter orgulho de prestar contas a todos os seus públicos.