Na mesma velocidade em que as transformações do mercado e do comportamento humano acontecem, aumenta também o interesse das organizações em acolher melhor seus funcionários. No entanto, uma linha tênue entre acolhimento e paternalismo deve ser respeitada, pois, uma vez que esse limite é ultrapassado, todo o esforço pode vir por água abaixo.
Antes de tudo, é bom entendermos o que é o acolhimento. Eu definiria como o processo de levar às pessoas conhecimento sobre os valores e a cultura da empresa, criando experiências que façam com que o colaborador se sinta incluído neste contexto e à vontade para viver o seu potencial. Mais do que a comunicação, embora ela também seja importante, essa relação requer cumplicidade, reciprocidade e transparência. Ou seja, junto a ela, deve ser exposto também o que se espera desse profissional, de seus comportamentos e quais são os seus deveres e responsabilidades enquanto membro da organização.
Contudo, na ânsia de acolher melhor, muitos líderes acabam por extrapolar a barreira que os levam a um comportamento paternalista, atitude que anda em uma direção completamente oposta aos propósitos do acolhimento. Isso porque, enquanto o acolhimento pode ter como resultados autonomia e liberdade, o paternalismo gera dependência e subordinação excessiva.
Quando uma empresa se posiciona de forma paternalista, ela se apresenta como uma entidade superior aos seus funcionários e se prontifica a solucionar problemas, seja em questões de carreira ou não, e que não necessariamente sejam de sua responsabilidade. Muitas vezes a organização chega a definir padrões de comportamentos até mesmo quanto à vida pessoal de seus colaboradores, acreditando que assim ela os está ajudando.
Paternalismo e a intervenção sobre a liberdade
Gerald Dworkin, filósofo americano, é autor de reconhecidos artigos sobre paternalismo e apresenta o conceito de forma bastante elucidativa quando sinaliza que a conduta paternalista resulta na “interferência sobre a liberdade de ação de alguém justificada por razões referentes exclusivamente ao bem-estar, benefício, felicidade, necessidades, interesses ou valores da pessoa coagida”.
Dessa forma, podemos concluir que o paternalismo interfere diretamente na liberdade individual, com a justificativa de proteção e garantia de bem-estar. Quando, na verdade, o líder paternalista apenas tolhe o direito de autonomia do profissional, diminuindo sua responsabilidade, bem como suas capacidades de decisão e solução de questões inerentes às suas rotinas laborais.
O dilema da permissividade
Ao trazer um comportamento paternalista para dentro da empresa, automaticamente se cria uma espécie de permissividade. A cultura do “tudo pode” como acontece entre pais e filhos, tende a infantilizar o funcionário. E isso pode ocorrer em todos os níveis hierárquicos, não diferindo entre um júnior, pleno ou sênior. Nesse contexto, podemos identificar uma dicotomia bastante problemática que é a liberdade versus responsabilidade.
Essas atitudes acabam por colocar em xeque a própria identidade da empresa. Gestores perdem sua capacidade de liderar, pois não identificam mais o ambiente em que estão inseridos.
Acolher para evoluir
Está claro que vivemos um momento em que promover processos cada vez mais humanos é essencial. No entanto, a aproximação entre líderes e colaboradores, aliada a uma comunicação mais transparente e genuína, não pode dar margem ao protecionismo. Bons gestores criam ambientes de escuta mais humanizados, mas nem por isso deixam de ter fala. É preciso passar ao profissional a noção clara de responsabilidade, de prazos, de expectativa e de insatisfação.
Cuidar de sua equipe não é protegê-la, mas abrir espaços para que cada indivíduo encontre seu próprio caminho de evolução. O papel do líder é ajudar seus liderados a provocar em si mesmos a evolução que buscam e que, por vezes, não se imaginavam capazes de realizar.