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Sedentarismo cresce e passa a ser preocupação das empresas

Sentar é o novo fumar, dizem. Apesar da comparação injusta, o sedentarismo começa a demandar ações corporativas como as direcionadas ao combate ao cigarro

Por Bárbara Nór
Atualizado em 21 set 2022, 16h48 - Publicado em 5 ago 2022, 08h47
E

stamos cada vez mais parados. Nos últimos dois anos, o isolamento social e a mudança de hábitos, como pedir mais delivery e trabalhar de casa, agravaram uma tendência que já era forte no Brasil: o sedentarismo.

Mesmo com o afrouxamento das medidas de segurança contra a covid-19, a tendência parece se manter. “Achamos que, com o fim do lockdown, as pessoas voltariam aos níveis anteriores. Mas, para nossa surpresa, a inatividade física aumentou 40,6%”, diz Luciana Vasconcelos, assessora técnica em saúde pública e epidemiologia na Vital Strategies, uma das responsáveis pela pesquisa Covitel, em parceria com a Universidade Federal de Pelotas, que avaliou os principais fatores de risco para doenças crônicas antes e depois da pandemia.

A definição de inativo, aqui, inclui o nível de movimento em todos os tipos de atividades — desde aquelas características do trabalho até as realizadas no ambiente doméstico, no lazer e na prática de exercícios físicos. Outro dado do estudo mostra também que, antes da pandemia, 38,6% dos brasileiros declaravam fazer mais de 150 minutos de atividade física no lazer por semana. No primeiro trimestre de 2022, o número caiu para 30,3%. E não é que antes estivéssemos em uma situação boa: já em 2018, a OMS colocava o Brasil como o quinto país mais sedentário do mundo — e o primeiro na América Latina, com 46% da população sedentária.

O problema por trás disso é sério. “Teremos uma população de doentes crônicos”, diz Luciana. “E o Brasil está envelhecendo, o que torna o cenário mais difícil.” Isso porque o sedentarismo é um dos maiores fatores de risco por trás das doenças crônicas que mais matam no mundo todo, como problemas cardiovasculares, diabetes e hipertensão, além de estar ligado a condições como Alzheimer e Parkinson [veja o quadro na página 27]. E não para por aí: dores crônicas, lesões osteoarticulares e até estresse e depressão podem ser agravados pelo sedentarismo.

O resultado: menos qualidade de vida, aumento nos custos dos serviços de saúde, mortalidade precoce e perda da produtividade média do brasileiro. Segundo uma estimativa de 2016 publicada no periódico The Lancet, a inatividade física custa à economia global 68 bilhões de dólares anualmente.

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“Quando não nos movimentamos, aceleramos o processo de envelhecimento das células e diminuímos nossa capacidade de regeneração”, diz o médico Paulo Zogaib, especialista em medicina do esporte do Hospital Sírio-Libanês. Um dos maiores problemas é o risco aumentado de doenças cardiovasculares, que seriam responsáveis por cerca de 30% das mortes no Brasil. “Cerca de 400 mil pessoas morrem por ano vítimas de doenças cardíacas”, afirma. As estimativas são da Sociedade Brasileira de Cardiologia.

Contra a natureza

Simplesmente não fomos feitos para ficar parados. “Em nossa história evolutiva, sempre estivemos em movimento — fazíamos atividades moderadas ou vigorosas em boa parte do dia ao plantar, colher, andar e caçar”, diz Bruno Gualano, professor da Faculdade de Medicina da USP, especialista em fisiologia do exercício e autor de estudos sobre promoção de estilo de vida saudável para populações clínicas. “Temos um conjunto de genes que funciona bem em movimento, e nosso ambiente moderno não nos dá as condições para isso.”

Mais do que não praticar esportes, o sedentarismo é um estilo de vida. Segundo Bruno, esse quadro ocorre com o excesso de tempo sentado ou deitado. Já a inatividade diz respeito à ausência de prática de exercícios físicos. A recomendação da OMS é de que se faça ao menos 150 minutos de atividade física moderada ou vigorosa por semana. Por isso, é possível ser ativo e ter uma rotina sedentária ao mesmo tempo.

Para piorar, mesmo aqueles que vão à academia antes do trabalho, por exemplo, ou fazem alguma outra atividade física, podem perder parte dos benefícios ao ficar o resto do dia sentados. E, com facilidades como elevadores, escadas rolantes e carros, tudo em nosso estilo de vida parece nos conduzir ao sedentarismo — principalmente o trabalho, quando a realidade em muitas empresas é passar 8 horas do dia sentado à frente do computador. A boa notícia é que não é preciso muito para reverter o quadro.

Em um estudo da equipe de Bruno, na USP, as pessoas foram convidadas a fazer alguma atividade leve, como se levantar e dar alguns passos, por dois minutos a cada uma hora. Elas foram comparadas a outro grupo, que ficou sentado o tempo todo. Essas pequenas quebras foram o suficiente para melhorar o açúcar no sangue e outros parâmetros inflamatórios ligados a doenças crônicas. “Com pequenas intervenções, melhoramos marcadores de saúde de maneira significativa”, diz Bruno.

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Saúde ocupacional

A constatação de que o sedentarismo é um problema não é exatamente novidade nas empresas, observa Douglas Roque Andrade, diretor de conhecimento e educação da Associação Brasileira de Qualidade de Vida (ABQV), que cita a popularidade de iniciativas como a ginástica laboral como uma forma de tentar contornar os efeitos negativos de passar muito tempo parado ou fazendo movimentos repetitivos. Desse entendimento vêm também campanhas sazonais, por exemplo, estimulando a atividade física ou, em alguns casos, oferecendo academias no próprio local de trabalho. No entanto, mais poderia ser feito. “O que acontece é que as empresas colocam um tipo de oferta, uma só intervenção, e acham que o assunto já está resolvido”, diz Douglas. Além disso, muitas ainda focam apenas a questão da prática de atividades físicas. Faltam, segundo ele, estratégias para reduzir o comportamento sedentário de forma geral — e contínua. “Só falar sobre o tema em um mês do ano e não diversificar as ações dificilmente produzirá efeitos”, afirma.

Ao que tudo indica, essa percepção é compartilhada pelos próprios funcionários. Em uma pesquisa com mais de 500 clientes do Gympass, benefício corporativo de subsídio a academias, 67% dos funcionários comentaram que gostariam que a empresa os ajudasse e incentivasse a fazer atividades físicas. Em contrapartida, apenas 34% das empresas fazem isso de forma contínua.
Por outro lado, o próprio fato de os problemas causados pelo sedentarismo serem tão amplos também pode ser uma vantagem. Segundo Bruno, da USP, promover a atividade física pode ser algo barato e escalável comparado com outros investimentos — e com muito mais retorno. “Com um programa só, conseguem-se efeitos sistêmicos e que dificilmente são obtidos com um único medicamento.” A estimativa, ele diz, é que, para cada dólar gasto com esse tipo de política, o retorno seja de 2,7 dólares.

Não é à toa que o combate ao sedentarismo é visto como uma das primeiras estratégias para a melhoria da saúde e do bem-estar dos funcionários. Não só os índices de doenças crônicas são reduzidos como a qualidade de vida melhora com o recuo do sedentarismo. “Em movimento, você estimula o organismo a produzir mais hormônios, o que facilita o raciocínio e a concentração”, diz Paulo. “Sua condição física melhora, você fica menos doente, sente menos dor, falta menos ao trabalho.”

No entanto, resultados como esses são de longo prazo e dependem de consistência. Daí, mais uma vez, a importância de que os programas de combate ao sedentarismo sejam permanentes. “A gente fala muito nos avanços da medicina e no tratamento das doenças graves, mas cada vez mais fica clara a importância da prevenção”, diz Gabriela Al-Cici, diretora de RH da Prudential, seguradora. “Para envelhecer com qualidade de vida, a resposta é exercício físico e boa alimentação.” Com isso em mente, a empresa fez parceria com o Vitality, um aplicativo de combate ao sedentarismo. O programa foi lançado em abril de 2021.

Na plataforma, os usuários preenchem um questionário de saúde e de hábitos como prática de exercícios físicos e alimentação, e podem anexar resultados de exames médicos. O aplicativo devolve, então, o que seria a “idade” da pessoa — que pode ser maior, menor ou igual à real. A partir disso, a ferramenta estabelece metas de atividades físicas e acompanha o cumprimento delas medindo dados como as batidas do coração por meio de um smartwatch. Quanto mais atividades feitas, mais pontos as pessoas acumulam, além de poderem subir de nível. Os pontos podem ser trocados por vouchers do iFood, da 99 ou do Spotify.

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Como forma de divulgar a iniciativa, a alta liderança foi convidada a capitanear times de corrida solidária em uma gincana interna em abril e julho. Cada equipe tinha um target, e, quando a meta de 3 mil pontos foi atingida, a empresa fez uma doação de 30 mil reais para duas ONGs. A empresa também estabeleceu uma parceria para que os funcionários pudessem comprar smartwatches com desconto, a fim de tornar o uso do aplicativo mais preciso. “Criamos um ecossistema de incentivo à prática de exercícios”, diz Gabriela, que cita também as aulas online de ginástica laboral e de meditação que são oferecidas ao vivo duas vezes por semana. A campanha, ela diz, foi um sucesso: depois de um ano, o aplicativo tem adesão de 65% dos funcionários da companhia. “As pessoas conversam sobre isso, dividem suas pontuações, falam se conquistaram nova classificação.” O desafio é manter os resultados. Para isso, a empresa lança periodicamente novas campanhas de comunicação, palestras e corridas solidárias, incentivando o uso do aplicativo. Agora a companhia se prepara para lançar uma nova pesquisa para medir a evolução. “Nossa maior expectativa é que a qualidade de vida dessas pessoas tenha melhorado com a mudança de hábitos”, afirma Gabriela. Outra ambição é conseguir usar esses dados de forma mais estratégica. “Queremos juntar diferentes frentes — os dados do aplicativo, do fornecedor de terapia e da plataforma de suporte ao funcionário — e cruzar as informações para ter uma leitura mais eficiente das métricas.”

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Um novo vilão

Se o sedentarismo não é um problema novo, ele talvez nunca tenha sido tão desafiador. O agravante? A popularização do home office. Sem o deslocamento para o escritório ou sequer para o refeitório, o quadro se acentua. Afinal, mesmo aqueles minutos para ir até a mesa do colega ou tomar um café contam como estímulo para mais movimento durante o dia. Em casa, por outro lado, as distâncias costumam ser entre o sofá e a mesa — ou pior, a cama. Assim, a não ser que seja feito um esforço intencional de se movimentar, a tendência é que se passe muito mais tempo parado. “A quantidade de passos é cinco vezes maior só pelo fato de ir ao escritório”, diz Priscila Siqueira, líder do Gympass no Brasil. “E temos visto muita dificuldade de tirar as pessoas de casa.” Entre os clientes do Gympass, 16% afirmam que não voltarão nem à academia no presencial. Um indicativo de que as empresas precisam oferecer alternativas que funcionem onde quer que as pessoas estejam, e também que combinem com os novos hábitos depois da pandemia.

Essa foi uma das maiores preocupações da companhia de benefícios VR, já em abril de 2020, quando o mundo entrava em lockdown. “Vimos que as pessoas passariam mais tempo em casa e emendando uma reunião na outra”, diz João Altman, diretor executivo de pessoas, marketing e cultura da VR. Em resposta, naquele mês foi lançado o programa Movimenta VR: aulas online e ao vivo de exercícios físicos todos os dias. “Contratamos professores especializados em diferentes modalidades, não só a tradicional ginástica laboral”, diz.

A ideia era poder variar o cardápio das aulas, que vão de ioga a boxe e exercícios de postura, a fim de atrair o maior número possível de pessoas. Embora a empresa já oferecesse subsídio para academia, as aulas foram uma forma de garantir que todos teriam acesso a algum tipo de atividade durante a pandemia. Para deixar clara a prioridade, o evento é marcado automaticamente na agenda de todos da empresa, para reservar o período. Mas, para quem não pode assistir online, as aulas ficam disponíveis depois, na rede interna da empresa.

Deu tão certo que continua até hoje. João conta que, mesmo no escritório, é comum ver funcionários que fazem juntos as aulas online. Por mês, são cerca de 920 visualizações de conteúdo. O índice de satisfação com os incentivos ao bem-estar também subiu, de 92% para 95%, e o de aprovação aos subsídios para a prática de atividade física foi de 77% para 88%. Para manter a adesão, a empresa premiou aqueles que mais frequentaram as aulas durante o trimestre. Os ganhadores receberam kits de ginástica em casa.

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Para João, a iniciativa está em linha com a busca por mais equilíbrio entre vida pessoal e profissional. “As pessoas estavam trabalhando demais, e isso era algo que sentíamos que poderia melhorar”, diz. Por isso, outras iniciativas foram o bloqueio do horário das 12h30 às 14 horas, quando não é permitido fazer reuniões, e a introdução da short friday, com o expediente se encerrando às 15 horas toda sexta-feira. “A ideia é que a pessoa possa usar esse período para fazer algo pessoal, se movimentar mais, estar com a família”, afirma João.

A cultura de culpa

Um dos maiores problemas em campanhas de combate ao sedentarismo é a individualização do problema, diz Douglas, da ABQV. Tornar-se ativo, ele afirma, é tratado como uma simples questão de motivação pessoal e de força de vontade. A campanha do Conselho Federal de Educação Física contra o sedentarismo, lançada em abril, usou como símbolo o bicho-preguiça, reforçando essa concepção. “Para mim, é inadmissível colocar essa questão só como uma decisão da pessoa, sem reconhecer outros determinantes, inclusive a própria jornada de trabalho”, diz Douglas.

Com esse discurso da simples força de vontade vêm elementos como a culpa, a associação direta do sedentarismo com a obesidade e com uma falha pessoal. O resultado pode acabar saindo pela culatra: em vez de ficarem motivadas para ser mais ativas, as pessoas podem desanimar e se considerarem incapazes de adotar novos hábitos. E é um erro associar diretamente o sedentarismo ao peso das pessoas. Além de estigmatizar uma parte do público, isso passa a falsa ideia de que quem é magro não precisa se preocupar. Um estudo da Universidade de Cambridge que avaliou mais de 334 mil pessoas ao longo de 12 anos apontou que o sedentarismo pode duplicar o risco de morte em comparação com a obesidade. “O ideal é entender a atividade física como um direito de todos, e não um dever do diabético ou de quem precisa emagrecer”, afirma Douglas.

Para Adriana Assunção, diretora de RH da DB Schenker, empresa de logística da Deutsche Bahn, operadora ferroviária alemã, uma das razões para o sucesso do programa que ajuda a combater o sedentarismo na empresa foi trazer a questão sob o olhar do autocuidado. Ou seja, em vez de focar questões como força de vontade ou emagrecimento, ter um estilo de vida mais ativo vem como algo que as pessoas podem fazer para cuidar de si e ter uma vida melhor.

E isso não é por acaso. O programa, chamado Plena@Mente, teve início depois de a empresa perceber os efeitos da pandemia sobre a saúde — tanto física quanto mental — das pessoas. Muitos funcionários tiveram perdas, inclusive enfrentando luto pela morte de pai e mãe, ou passaram por momentos importantes durante a pandemia, como o nascimento de um filho.
O projeto surgiu com a proposta de contemplar a saúde e o bem-estar em vários aspectos, com rodas de conversa, atendimento psicológico e caminhadas em parques. Um dos principais motores do programa foi o lançamento, em setembro de 2021, de um aplicativo de gamificação chamado RadarFit, para motivar os funcionários a fazer atividades físicas e ter outros hábitos saudáveis, como beber mais água e praticar mindfulness.

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Quanto mais atividades os funcionários fazem, que são registradas por meio de fotos no aplicativo, mais “fitpoints” eles juntam, podendo trocá-los por consultas médicas, sessão com personal trainer ou equipamentos de ginástica, por exemplo. Antes de a ferramenta ser lançada, os líderes foram treinados para fazer a gestão desse autocuidado. “Os gestores precisavam entender que essa era uma responsabilidade deles, e não só do RH”, diz Adriana. Depois, todos os funcionários receberam um kit de saúde e bem-estar, com uma camiseta para as caminhadas, uma bolinha antiestresse e um copo com tampa. Em sete meses, foram mais de 63 mil missões completadas no aplicativo, que também pode ser utilizado por dependentes dos funcionários.

O desafio do engajamento

A estratégia da gamificação tem ganhado cada vez mais adeptos. Aplicativos como os usados pela Prudential e pela DB Schenker tentam atingir o que parece ser a maior dificuldade em qualquer programa de combate ao sedentarismo: o engajamento e a adesão das pessoas. Mas a solução também deve passar por modificações no ambiente corporativo, segundo os especialistas. Um exemplo é o uso de mesas ajustáveis, que permitem que as pessoas trabalhem em pé ou sentadas. Outros incluem lembretes para usar as escadas quando possível e até posicionam bebedouros ou o café em locais mais distantes das estações de trabalho. Em 2012, o Google fez uma pesquisa para descobrir o que suas equipes mais eficazes tinham em comum. A resposta surpreendeu a própria empresa: mais importante do que os atributos de cada membro do time era a maneira como eles trabalhavam juntos. O projeto foi chamado de Aristóteles, em homenagem à citação atribuída ao grego: “O todo é maior do que a soma de suas partes”.

Questões da própria jornada também entram em jogo: marcar uma reunião após a outra, por exemplo, impede que as pessoas façam pausas para se movimentar. Por isso é tão importante também ter o apoio da alta liderança, para que mudanças como essas sejam feitas. “Se os líderes não se envolvem, as pessoas não se sentem confortáveis em parar um tempo para se movimentar, e essas iniciativas não são valorizadas”, afirma Douglas.

Mas é importante entender o público e suas particularidades. Para cada perfil existem diferentes barreiras e facilitadores, que precisam ser identificados. “Pode haver um funcionário que não queira subir a escada porque tem uma condição no joelho, outro que não goste de jogar futebol”, diz Bruno, da USP. Isso sem falar em pessoas com deficiência ou outras condições que exijam adaptações no movimento.

A conscientização, claro, também é necessária — mas talvez não seja o maior desafio. “Se colocarmos 100 sedentários em uma sala e perguntarmos se é importante fazer exercício, todos afirmarão que sim”, diz Tomás Camargo, fundador da VIK, aplicativo de gamificação voltado para o estímulo de atividade física. “Mas não basta ter conhecimento, é preciso ir além.” Para ele, um dos pontos fundamentais é que os programas de combate ao sedentarismo sejam fáceis de participar. “Para mudar o comportamento, é necessário alterar hábitos”, diz Tomás. Não só os esforços devem ser contínuos, como os objetivos precisam ser mais modestos e diversificados, de forma que todos possam ser incluídos. “Focar pequenos resultados e conquistas ajuda a manter o indivíduo engajado.” Caso contrário, o risco é desanimar justamente aqueles que mais se beneficiariam do programa.

É por isso que iniciativas como patrocinar uma corrida anual, por exemplo, podem não ter resultados. Quem já não é ativo o resto do ano dificilmente se sentirá apto ou motivado para cumprir o desafio — e, mesmo se o fizer, de nada adiantará só treinar durante algumas semanas e voltar ao ritmo anterior depois.

Prática elitizada

No Brasil, outro fator que contribui para os altos níveis de sedentarismo é o fato de que a prática de exercícios físicos ainda é vista como algo reservado para poucos. Luciana, da Vital Strategies, destaca, por exemplo, a queda expressiva de atividade física entre aqueles que perderam emprego na pandemia: nesse público, a redução foi de 504%. A hipótese é de que a redução da renda influi diretamente no nível de sedentarismo. “A atividade física ainda está muito vinculada a pagar uma academia ou um clube”, diz.

Como a realidade urbana no Brasil é de muitas cidades com poucos parques e praças públicas, calçadas em estado precário e sensação de insegurança na rua, a tendência é que as pessoas não pensem em usar o espaço público para se movimentar. Assim, só restariam lugares fechados — e muitas vezes pagos — como alternativas.

No Gympass, por exemplo, 70% dos usuários estão nos planos mais básicos. “Isso mostra que são pessoas que antes não tinham acesso às atividades físicas, especialmente quando vindas das áreas operacionais”, diz Priscila. Outro fator que pesa, aliás, é a participação da família nas atividades. Segundo o Gympass, oferecer o subsídio também para familiares faz a adesão ao benefício subir sete vezes.

Incentivo extra

A Buser, plataforma de intermediação de viagens rodoviárias, criou outra forma de motivar a adesão a uma atividade física: o bolso dos funcionários. “Sempre acreditamos na importância de criar condições para que as pessoas tivessem energia para trabalhar”, afirma Cesar Barboza, diretor de RH da Buser. “Para nós, o esporte ajuda muito a manter um ambiente mais leve e positivo.”

Lá, quem pratica atividade física por pelo menos quatro horas na semana quatro vezes por mês ganha um bônus de 10% do salário. Já quem atinge a meta em pelo menos três semanas ganha um bônus de 5%. Todo início do mês, os funcionários preenchem um formulário para contar como foram as atividades e escolher, em uma relação com cerca de 40 modalidades, quais pretendem seguir. A ideia é também acumular dados que possam ajudar a empresa a repensar os benefícios. “Se todo mundo falar que anda de bicicleta, podemos investigar se vale a pena fazer parcerias com empresas de aluguel de bicicleta, por exemplo”, diz Cesar.

Além disso, é possível observar quando algumas pessoas que costumavam praticar esportes passam a marcar menos atividades no mês, o que pode servir de alerta para possíveis problemas no trabalho, como a agenda mais cheia, ou até pessoais, comenta Cesar. Segundo ele, o benefício também ampliou a atratividade da empresa nos processos seletivos e entre os recém-contratados. “As pessoas ficam interessadas e muitas começam a praticar esporte para poder ganhar o valor.” No último ano, a adesão ao benefício do bônus subiu de 70% para 92%, e a do subsídio para academia foi de 30% para cerca de 50%.

Na plataforma corporativa de troca de mensagens, os funcionários compartilham fotos praticando atividades físicas e organizam, por iniciativa própria, torneios de vôlei de praia. Por isso, para Cesar, as vantagens não são só quantitativas — como o número de afastamentos por motivo de saúde próximo de zero e o baixo uso do plano médico —, mas também são sentidas na cultura da empresa. “Para nós, a prática ajuda no engajamento, na proximidade das pessoas e na criação de laços afetivos.”

Os efeitos do sedentarismo

Segundo a OMS, cerca de 3,2 milhões de pessoas no mundo morrem todo ano por causas relacionadas à insuficiência do movimento. Outras estimativas já apontam que esse número pode chegar a 5 milhões. Veja os dados:

  • 20% é o crescimento do risco de morte para quem passa mais de oito horas por dia sentado.
  • De 16 a 30% é a redução dos perigos de desenvolvimento de condições que levam à morte quando os indivíduos passam de inativos para moderadamente inativos.
  • De 12 a 13% é o aumento do risco de morte precoce e desenvolvimento de doenças cardíacas para quem passa de seis a oito horas sentado diariamente, em comparação aos ativos.

Fontes: 1Manifesto Internacional para a Promoção da Atividade Física no Pós-covid-19: Urgência de uma Chamada para a Ação, 2020; 2Association of Sitting Time With Mortality and Cardiovascular Events in High-Income, Middle-Income, and Low-Income Countries, 2022; 3Physical Activity and All-cause Mortality Across Levels of Overall and Abdominal Adiposity in European Men and Women: the European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition Study (EPIC), 2015

Visão holística

A inatividade pode afetar também a saúde mental, além da física. Entenda:

  • Passar mais de oito horas por dia sentado tem impactos negativos na saúde mental, mesmo entre quem pratica 150 minutos de exercício físico de intensidade moderada ou vigorosa por semana.
  • Uma análise de 18 estudos mostrou que indivíduos expostos a comportamentos sedentários tinham risco 30% maior de sofrer de demência.
  • A saúde mental das famílias de baixa renda foi mais afetada pela falta de atividade física na pandemia. Um dos motivos é a falta de acesso a infraestrutura para a prática nos bairros, como áreas verdes.

Fontes: 1. The Impact of Sitting Time and Physical Activity on Mental Health During Covid-19 Lockdown, 2021; 2. Association Between Sedentary Behavior and the Risk of Dementia: A Systematic Review and Meta-Analysis, 2020; 3. Examining the Relationship Between Physical Activity and Mental Health During the Covid-19 Pandemic Across Five U.S. States, 2021. Ícones: Flaticon.com

Cinco passos para combater o sedentarismo

Promover a prática de exercícios no ambiente corporativo traz vantagens para a saúde física, mental e social dos funcionários, além de reduzir o absenteísmo e o esgotamento profissional. Mas é preciso tomar alguns cuidados para que elas sejam efetivas

  1. Entenda seu público
    Para atacar o sedentarismo, soluções únicas não bastam. É preciso analisar os diferentes perfis na empresa e entender os fatores que podem contribuir para o sedentarismo em cada um deles, como a presença ou não de dores articulares, dificuldades de locomoção e ritmo da jornada de trabalho.
  2. Diferencie inatividade de sedentarismo 
    A prática de atividade física é importante e deve ser estimulada. Mas é preciso também combater a inatividade, que é o hábito de passar muitas horas sentado. Para que as pessoas possam seguir essa recomendação, vale rever políticas da empresa, para evitar, por exemplo, reuniões longas e sem intervalos ou até mesmo incentivar que os profissionais alternem períodos sentados e em pé durante os encontros duradouros. Vale também estimular o deslocamento ativo até o trabalho, oferecendo bicicletários ou incentivos para quem faz o trajeto de bike ou a pé.
  3. Crie formas de motivação
    Quanto maior a inatividade, maior a dificuldade para se movimentar — é a lei da inércia. Estratégias como a gamificação e o oferecimento de recompensas para aqueles que conseguem se mexer mais podem ser saídas para aumentar o engajamento. Além disso, envolver a família, inclusive nos subsídios de academia, contribui para maior adesão. Mudanças no ambiente também são uma estratégia, como o uso de mesas de altura ajustável, que permitem trabalhar em pé.
  4. Estabeleça metas mais inclusivas
    Quanto maior a inatividade, maior a dificuldade para se movimentar — é a lei da inércia. Estratégias como a gamificação e o oferecimento de recompensas para aqueles que conseguem se mexer mais podem ser saídas para aumentar o engajamento. Além disso, envolver a família, inclusive nos subsídios de academia, contribui para maior adesão. Mudanças no ambiente também são uma estratégia, como o uso de mesas de altura ajustável, que permitem trabalhar em pé.
  5. Ofereça opções diversificadas
    Ao estimular a prática de atividade física e o estilo mais ativo, quanto mais diversificadas forem as propostas, melhor. Podem variar não só os benefícios — com subsídio para diferentes tipos de academias e esportes — como as práticas da empresa, com opções pensadas para diversos públicos, como pessoas de faixas etárias mais avançadas ou com restrição de mobilidade.

O novo tabagismo?

Pesquisas associam os riscos da inatividade ao de fumar, embora uma revisão de estudos indique que o tabagismo é muito mais danoso para a saúde.

  • 5 milhões é o número anual de mortes decorrentes da falta de atividade física
  • 7 milhões é o número anual de mortes associadas ao tabagismo, segundo a OMS
  • 8,8% é a contribuição do sedentarismo acompanhado de inatividade no número total de mortes
  • 10,6% é a contribuição do tabagismo no número total de mortes
  • 20% é o aumento do risco de morte prematura por qualquer causa entre inativos
  • 180% é o aumento do risco de morte prematura por qualquer causa entre fumantes

Fontes: 1Manifesto Internacional para a Promoção da Atividade Física no Pós-covid-19: Urgência de uma
Chamada para a Ação, 2020; 2Association of Sitting Time With Mortality and Cardiovascular Events in
High-Income, Middle-Income, and Low-Income Countries, 2022; 7Evaluating the Evidence on Sitting, Smoking,
and Health: Is Sitting Really the New Smoking?, 2018

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Esta reportagem faz parte da edição 81 (agosto/setembro) de VOCÊ RH. Clique aqui para se tornar nosso assinante

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