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“Todo líder é um pouco responsável pela harmonia na vida pessoal do time”

As lições do colombiano Santiago Chamorro, que assumiu a presidência da GM América do Sul em um momento crítico para a companhia — e para o mundo

Por Marcia Kedouk
Atualizado em 23 out 2024, 17h20 - Publicado em 4 fev 2022, 07h00
Santiago Chamorro está de pé, apoado sobre um corrimão. Ele veste um blazer, camisa xadrez azul, calça jeans e cinto e sorri para a foto
Santiago Chamorro (Divulgação/VOCÊ RH)
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uando chegou a São Paulo vindo de Michigan, onde atuava como vice-presidente da GM Global Connected Services, o colombiano Santiago Chamorro encontrou um ambiente desafiador, mas familiar. O executivo já havia comandado a operação brasileira da General Motors entre 2013 e 2016, retornando em agosto de 2021, desta vez para liderar as operações na América do Sul. Sua nomeação aconteceu em um momento de retomada das operações depois de quatro meses de paralisação da produção, motivada pela crise global no fornecimento de semicondutores.

Formado em economia e pós-graduado em finanças, Santiago começou na multinacional 27 anos atrás, em uma posição no marketing, área que assumiu em 2003. Aos 38 anos, chegou à presidência da GM na Colômbia, “muito antes do que imaginava”, diz ele, que se preparou para a oportunidade com o auxílio de uma técnica de planejamento de longo prazo aprendida ainda no começo de sua carreira. Nesta entrevista a VOCÊ RH, ele conta como desenha sua jornada profissional para harmonizá-la com a vida em família e fala das metas da GM até 2025, do papel estratégico do RH e das lições que aprendeu desde que assumiu seu primeiro cargo de gestão.

Você tem formação em economia e construiu sua carreira em marketing e vendas. Como foi essa trajetória?
Comecei na área de finanças de um banco na Colômbia. E aí fui chamado pela Texaco para participar de um processo seletivo na área financeira. Na entrevista, o gerente me falou: “Olha, existe a vaga de analista aqui, mas você tem um perfil comercial, e uma colega do marketing está com uma oportunidade aberta também. Você não quer falar com ela?”. Eu fui. E, ao final da conversa, a líder disse que eu havia sido aprovado e, então, precisaria escolher entre a posição de marketing e a de finanças. Pensei: “Marketing me parece interessante — eu vou lá”. Até que fui chamado para participar de um processo da GM, ainda na Colômbia. E foi um processo muito bonito, porque eles já tinham desenhado para a vaga que esse profissional tivesse um treinamento em vários países da América do Norte e do Sul. Ao final de um ano, haveria a possibilidade de participar de seletivas para posições gerenciais. Eu fui o mais jovem da turma de candidatos. Só que eles me ligaram dizendo que aquele processo não era para mim, mas que queriam me oferecer um trabalho — não sabiam qual, mas queriam. “Você vai começar fazendo um projeto na área comercial, e então vamos ver o que é bom para você”, disseram. Eu topei. O que eu não imaginava era que eles tinham escolhido duas pessoas para atuar nesse modelo: eu e outro profissional, bem mais experiente. Para cada um de nós, deram um desafio. Depois de 90 dias, apresentamos o projeto, e eu ganhei, fiquei com a vaga, que, no fim das contas, me proporcionou o treinamento internacional. E aqui estou eu, 27 anos depois.

Quais os aprendizados trazidos nessa transição para a liderança?
Mudou demais a minha percepção, no seguinte sentido: quando você recebe a responsabilidade de ter um time contigo, ganha, de certa forma, um peso importante. Pessoas passam a depender de você para se desenvolver profissionalmente, para ter harmonia na vida pessoal — afinal, você pode ser um líder que vai contra essa harmonia ou um que converge. Ter essa clareza de ser um pouco responsável pelo destino profissional e pessoal das pessoas que trabalham contigo é uma coisa que tem que ser levada muito a sério. E que muda completamente o seu agir, antes e depois de tornar-se líder. Você não está mais sozinho.

Como construir um ciclo tão longevo na mesma empresa em tempos tão voláteis?
Às vezes as pessoas me perguntam se foi sorte ou oportunidade. Quero pensar que tem um desenho da minha parte. Logo no começo da minha carreira, recebi um convite para trabalhar em Detroit. Lá, participei de um treinamento em que aprendi a utilizar uma ferramenta de planejamento de longo prazo. Quando voltei para casa, falei à minha esposa: “Olha, se estivermos dispostos a caminhar pelos cenários 1, 2, 3 ou 4, e se, por acaso, abrirem-se as possibilidades X, Y ou Z, talvez, um dia, eu consiga ser o presidente da GM na Colômbia. Eu almejava aquela posição como o máximo cargo da minha carreira. As coisas que vieram como conclusão dessas projeções que fizemos no papel foram abraçar o assunto da carreira internacional, aperfeiçoar o inglês e continuar com a minha educação formal

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associada a vendas e marketing — naquela época, começava-se a falar em marketing digital, por exemplo. Tudo isso fez com que, aos 38 anos, eu fosse presidente da GM na Colômbia, muito antes do que eu imaginava no momento em que fiz o planejamento no papelzinho com a família. E isso aconteceu com tremendos sacrifícios, também, de conduzir essa vida internacional que me levou para os Estados Unidos, para o Chile, para o Brasil. Então, sobre a longevidade na minha carreira, as mudanças aconteceram muito rápido — no início, a cada dois, três anos; depois que fui crescendo, um pouco mais devagar, porque acho que, quanto maior a responsabilidade, a missão passa a ser mais sofisticada e a requerer um pouquinho mais de tempo.

E você continua fazendo esse planejamento no papel com a sua esposa?

Sim, todos os anos a gente, de alguma forma, se prepara para as oportunidades que podem vir. E para falar “sim”, mas também “não”, porque algumas delas não são compatíveis com a família ou os desenhos profissionais que eu tenho na minha cabeça. Veja, um tempo atrás, recebi o convite para uma posição na Coreia do Sul. Falei: “Não posso”. É que, no desenho que eu tinha no meu papelzinho, não fazia sentido, porque a família precisava da gente, com pais e sogros em uma idade em que a proximidade é importante, com filhos na faculdade. Então, consegui recusar de uma forma bem argumentada.

Como foi reassumir em setembro, em um momento difícil para o setor e para a companhia, especialmente no Brasil, com a paralisação das operações?

Na pandemia, todo mundo ficou atrás de uma tela — no celular, no computador, na TV —, o que fez com que, no mundo inteiro, faltassem semicondutores. Na América do Sul, tivemos um impacto importante de perda de volume por causa dessa questão. E foi absolutamente necessário aproveitar as fortes parcerias que mantemos com nossa rede de concessionárias e com o time das nossas fábricas, comunicando de forma muito clara e ampla a realidade enfrentada globalmente e as medidas para que pudéssemos passar por isso. Depois as fábricas voltaram a produzir, os veículos voltaram às mãos dos clientes — celebramos, ainda em novembro de 2021, a posição de número 1 no varejo, com o Ônix retornando ao posto de mais vendido. Recebemos a notícia com alegria, mas reconhecendo que ainda haverá uma volatilidade sobre esse assunto de semicondutores e componentes entrando em 2022, talvez na primeira metade do ano.

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Quais foram os maiores aprendizados da pandemia para os negócios?

Para o mundo inteiro, não foi fácil passar pela pandemia e encontrar formas seguras de continuar o trabalho, a manufatura, a fabricação de veículos. A capacidade de interagir dessa forma virtual e de aprender outros métodos que até então não eram tão presentes assim foi fundamental para conseguirmos fazer com que os negócios andassem. Na minha passagem anterior, já estávamos começando a falar do tempo flexível, de trabalhar à distância. E a pandemia acelerou muito esse processo.

A GM anunciou a meta de ter faturamento anual duplicado até 2030 e investimento de 35 bilhões de dólares até 2025 em mobilidade elétrica e autônoma. Como o Brasil se situa nessa projeção?

Essa estratégia está alinhada com nossa missão de ter um mundo zero emissões, zero congestionamentos e zero acidentes. Abrem-se, então, oportunidades de negócios que vão nos levar nessa direção. Por exemplo, com softwares embarcados nos automóveis que detectam quando houve acidente e entram automaticamente em contato com os serviços de emergência. Ou aplicações que se conectam de forma remota com o veículo para, se necessário, dar partida no motor e ligar o ar-condicionado para a temperatura estar adequada quando o motorista entrar, ou até permitir acesso, de forma remota, a alguém da família para utilizar o veículo. Outro elemento da nossa estratégia é a eletrificação. A GM está apostando forte no assunto e devemos ter, até o meio da década, o lançamento de cerca de 30 modelos de veículos elétricos. E queremos promover a entrada deles aqui na região, mas assumindo que existe, nesse caminho, considerações importantes. O cliente precisa reconhecer os benefícios do veículo elétrico não só para o meio ambiente como também para ele e para a família. Temos de trabalhar com os governos nas questões de regulação; há desafios de infraestrutura, para que o cliente possa fazer a carga do veículo. E, internamente, também existe toda uma experiência que nos leva a pensar em novos modelos de negócios.

Qual é o maior desafio em liderar num modelo híbrido de trabalho?

Adotamos a mesma política globalmente, chamada Work Appropriately — trabalhar de forma apropriada. Basicamente, dividimos o pessoal em três grupos: o que precisa fazer o trabalho nas instalações, como manufatura e alguns da engenharia, seguindo protocolos de segurança; o que continua de forma remota, como os que atuam em vendas e pós-venda; e os que se situam em um modelo híbrido, como o administrativo, em que, às vezes, por convite, vão até a empresa, por exemplo para dar as boas-vindas a funcionários que se juntam à companhia. Mas, independentemente da função, cada um determina com seu líder qual é a forma mais apropriada para si. Essa é a verdadeira flexibilidade.

Qual é a importância do RH nesse contexto?

O RH é fundamental em diversos pontos. Primeiro, na comunicação, que tem que ser frequente, aberta, franca. E o RH nos ajuda a entender quais são os assuntos que estão na cabeça e no coração das pessoas. E esses assuntos às vezes são difíceis — e às vezes não sabemos as respostas, aprendemos juntos.

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A saúde mental entrou de vez na pauta corporativa, especialmente na pandemia. Como o RH e os gestores podem cuidar melhor dos funcionários?

Algumas pessoas falam em “balanço” entre vida pessoal e trabalho; eu não gosto muito dessa expressão. Falo em “harmonia”. Balanço, na minha opinião, dá uma ideia de que é preciso estar no meio, e dificilmente você consegue o fifty-fifty. Já a harmonia parte do princípio de que o desbalanço existe e faz parte, às vezes em direção à família, às vezes ao trabalho. E o RH tem ajudado demais a determinar qual é a harmonia que funciona mais. E os líderes têm a missão de garantir segurança psicológica nas conversas, acolher as opiniões diferentes com tranquilidade. Quando fazemos isso, conseguimos melhores discussões, melhores decisões, melhores resultados.

E como você cuida da sua saúde mental?

Na minha opinião, saúde mental é harmonia. O que funciona para mim é me dedicar de maneira fortíssima durante a semana ao trabalho, e no fim de semana à família. Tipicamente, é no domingo à tarde que eu começo, num par de horas, a cuidar da semana que vem.

Este trecho faz parte de uma reportagem da edição 78 (fevereiro/março) de VOCÊ RH. Clique aqui para se tornar nosso assinante

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