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Mais autonomia e trabalho por projetos: conheça a carreira em nuvem

Ampliar a autonomia e dar oportunidades para funcionários desenvolverem competências fora do escopo de sua área são tendências. Sua empresa está pronta?

Por Bárbara Nór
Atualizado em 7 jan 2022, 13h41 - Publicado em 20 ago 2021, 07h00

Como preparar os funcionários para o desconhecido? Se essa questão não é nova, ainda está longe de deixar de ser relevante, sobretudo depois da pandemia. Na última pesquisa Global Human Capital Trends, da consultoria Deloitte, a habilidade dos profissionais de se adaptar, requalificar e assumir novos papéis foi identificada como a mais importante para 72% dos executivos entrevistados. Esses números se refletem na outra ponta. A mesma competência é considerada por 60% dos funcionários como a mais urgente a desenvolver. Ainda assim, a tarefa não tem sido fácil: apenas 17% dos executivos consideram que seus funcionários estão prontos para isso.

Na Roche, farmacêutica global, o desafio se tornou ainda mais urgente no último ano. Movida pela necessidade de responder mais rapidamente às mudanças, a empresa vem buscando se transformar para trabalhar de uma forma mais dinâmica e flexível. Por isso, criou um plano global para se organizar internamente a partir da necessidade dos clientes — com o objetivo de entregar o dobro de medicamentos a um custo menor. Mas o que a empresa percebeu foi que atingir esse objetivo não seria possível sem rever a própria forma de olhar para o desenvolvimento e o trabalho de seus empregados.

“Quando você se propõe a fazer desenhos com o cliente, precisa responder a demandas diferentes de forma rápida”, diz Denise Horato, diretora de RH da Roche Farma Brasil. “As empresas muito hierarquizadas e com caixinhas para cada pessoa acabam limitando o que cada um pode fazer.” Seria preciso entender como desenvolver as pessoas em um cenário mais dinâmico sem estar preso a funções ou hierarquias. Para pensar em soluções, um grupo de discussão surgiu dentro do RH, com a participação de outras áreas. Junto a grupos de outros países, foi criada no fim de 2020 a plataforma Workday, lançada no Brasil em janeiro.

Nela, qualquer pessoa da empresa pode anunciar um projeto e descrever o tipo de ajuda de que precisa. Por meio de um algoritmo, a plataforma faz um match entre as pessoas mais indicadas para atuar no projeto — não importa a função ou o lugar do mundo em que estejam. Apesar da ajuda tecnológica, qualquer um é livre para se candidatar a um projeto pelo qual se interessou. Os funcionários podem permanecer em suas posições, mas experimentando diversos projetos, ou gigs, que podem durar semanas, meses ou anos — e têm autonomia para organizar o próprio tempo entre atividades do dia a dia e do “bico”. Com tudo isso, a Roche pretende estimular a independência e o autogerenciamento. “É preciso tempo para as pessoas assimilarem o trabalho em rede de maneira conectada e aproveitarem a inteligência coletiva”, diz Camilla Panachao, gerente de desenvolvimento de talentos da companhia e uma das líderes do programa. Atualmente, há 15 projetos iniciados no Brasil e 96 no mundo.

Mais conexões

Iniciativas como essa estão em linha com a ideia do internal talent marketplace, criado por pesquisadores da Deloitte para responder aos desafios dos novos modelos de trabalho. O conceito prega que exista uma forma mais efetiva de conectar trabalho aos profissionais de uma empresa. As pessoas seriam, assim, expostas a uma série de experiências por meio de freelas, estágios, mentorias e participações em projetos. O resultado é o uso mais flexível e eficiente das diferentes habilidades de cada um na empresa, além de ser uma forma de desenvolvimento prática, tanto de habilidades técnicas quanto comportamentais.

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A ideia é que os profissionais não precisem buscar outras empresas para fazer algo novo: as companhias passam a ser uma rede de oportunidades e aprendizagens. Isso evitaria perder alguém por falta de desenvolvimento ou de crescimento. “Ainda é muito comum as grandes empresas perderem jovens não para outras grandes empresas, mas para as startups”, diz Antonio Salvador, líder de negócios de carreira na Mercer Brasil. Já há algum tempo as companhias vêm tentando emular o ambiente das startups. Mas isso vinha sendo feito, ele diz, criando departamentos ou projetos específicos de inovação — excluindo boa parte das pessoas. “Ficava uma área de escolhidos e o resto em um dia a dia chato.”
Para Jean Rosier, cofundador da Sputnik, escola de educação corporativa, a tendência é que as empresas ofereçam experiências para que os funcionários se desenvolvam de forma mais completa. “Passa-se a enxergar esse indivíduo não como uma máquina, mas levando em conta tudo o que ele é”, explica Jean.

Desenvolvimento na nuvem

Não é de hoje que o conceito de carreira vem sofrendo reformulações: a tradicional, de degraus até a liderança, já foi desdobrada para a carreira em Y e para a carreira em W. Agora, segundo Rafael Souto, CEO da consultoria Produtive, chegamos à época da “carreira em nuvem”: em vez de trajetórias lineares, as pessoas se envolvem em projetos e equipes multidisciplinares e não seguem rotas definidas. “Esses movimentos não lineares, em nuvem, são uma estratégia para as pessoas circularem e se desenvolverem”, afirma Rafael.

Na EDP Brasil, empresa de energia, o conceito de trilha de carreira deixou de existir desde o final de 2019, quando a companhia reformulou o olhar sobre o desenvolvimento dos funcionários. O conceito antigo, de atrelar treinamentos a cada etapa da carreira, não dava mais conta da realidade dos negócios. “Vivemos muitas mudanças, tanto sociais quanto corporativas, além do contexto de transformação tecnológica e, recentemente, da pandemia”, diz Bruno Curado, gestor operacional de gestão de pessoas da EDP. “Da forma como estávamos estruturados, não conseguíamos acompanhar as mudanças.” Agora, em vez de trilhas de educação predefinidas e obrigatórias, os profissionais acessam diferentes jornadas de aprendizado e desenvolvimento que podem ser trilhadas e cada um é responsável por escolher aquilo que deseja aprender.

Uma das principais ferramentas para essa novidade é uma plataforma com mais de 30.000 produtores de conteúdo. Os funcionários, que recebem sugestões de acordo com seus interesses e perfis com a ajuda de um algoritmo. A iniciativa também ajuda os gestores a terem mais autonomia: em vez de pedir um treinamento para o RH, podem procurar o assunto na própria plataforma e indicá-lo às equipes.
Além disso, há um programa de multiplicadores do conhecimento, em que qualquer funcionário pode criar um workshop ou curso e convidar outras pessoas da empresa. Desde a mudança, houve um aumento de 420% no número de conteúdos partilhados entre os próprios empregados. “É uma transformação grande de mentalidade, que exige das pessoas vontade e interesse”, diz Bruno.

Grandes desafios

Nesse sentido, a tecnologia pode facilitar as mudanças, já que permite divulgar informações com rapidez. Por outro lado, os principais desafios ainda são um tanto analógicos. “Não é da noite para o dia que as empresas vão se adaptar a esse modelo e vão virar a chave”, diz Luiz Barosa, da Deloitte. “É preciso sensibilizar a organização, talvez começar pequeno e escalar em um modelo de agilidade e saber comunicar o propósito por trás do projeto.”

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Para Rafael Souto, um problema sério está nas lideranças que ainda se baseiam no controle das equipes e na pressão por resultados de curto prazo — o que não deixa que exista espaço para o diálogo e a visão mais flexível sobre carreira. As próprias políticas da empresa, como precisar de permissão da chefia para participar de projetos ou de processos seletivos internos, por exemplo, podem atrapalhar. E, do outro lado, ainda há uma expectativa grande por parte de funcionários por um plano previsível de carreira e desenvolvimento. Muitos podem esperar — ou preferir — que a empresa diga o que fazer. “Eles ainda estão na onda de plano de carreira; a conversa sobre protagonismo também é nova para eles”, explica Rafael.

Diálogos de carreira mais regulares, estruturados e que favoreçam a movimentação das pessoas são uma forma de mudar a cultura aos poucos. E, em vez de convidar apenas alguns funcionários para projetos, é importante democratizar as oportunidades. Para que isso funcione, é necessário dar abertura para os empregados poderem mostrar seus interesses e dúvidas — inclusive, para os que preferem se manter em caminhos mais tradicionais.

Por fim, um cuidado deve ser tomado: não sobrecarregar as pessoas. Impor esse modelo para todos sem comunicação apropriada e sem trabalhar aspectos de cultura pode não funcionar e fazer com que alguns se sintam esgotados em vez de mais motivados. Antonio Salvador, da Mercer, aponta ainda um desafio adicional para o Brasil: temos problemas de educação básica de uma grande parte da população de um lado e, de outro, a fuga de talentos qualificados, o que só deve se agravar com a possibilidade de trabalhar remotamente para empresas fora do Brasil. “Vamos ter, sem dúvida, um conjunto de profissionais que não vai conseguir se preparar para o mercado que vislumbramos”, diz. “As empresas precisam cobrar por políticas públicas de educação. Não adianta ser uma companhia de sucesso em um país de miseráveis.”

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Esta reportagem faz parte da edição 75 (agosto/setembro) de VOCÊ RH

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