Funcionária CLT consegue reduzir jornada em 50% para cuidar do filho com paralisia cerebral
Decisão do TST contribui para diminuir a exclusão feminina do mercado de trabalho e afirmar que a maternidade não é obstáculo profissional, diz especialista.

A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu o direito de uma técnica de enfermagem da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) de reduzir sua jornada de trabalho em 50% para cuidar do filho com paralisia cerebral, sem redução salarial e sem necessidade de compensação de horários.
A decisão foi unânime.
Na ação trabalhista, a profissional disse que seu filho, então com 16 anos, nasceu prematuro e, na incubadora, foi infectado por um vírus que causou paralisia cerebral, encefalopatia crônica, surdez e diversos déficits cognitivos e motores. Com isso, vinha enfrentando uma dura batalha para garantir ao menino todas as terapias recomendadas para melhorar seu desenvolvimento.
Empresa alegou que empregada era celetista
Do outro lado, a Ebserh defendeu que a funcionária é regida pela CLT e por determinações complementares internas e, por isso, não haveria previsão legal para reduzir a jornada sem diminuir o salário proporcionalmente. Alegou, ainda, que a aplicação de normas destinadas a servidores públicos violaria o princípio da legalidade administrativa, por beneficiar apenas uma empregada celetista em situação particular.
“Trata-se de uma empregada, mãe de uma criança com deficiência, diante da necessidade de cuidados intensivos”, ressalta Taciela Cordeiro Cylleno, juíza federal do trabalho e especialista em liderança e futuro do trabalho. “Mesmo sem previsão expressa na CLT, o TST aplicou os princípios constitucionais para garantir o direito dessa família”, explica ela, que os destaca:
- A dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho são fundamentos do nosso Estado (art. 1º);
- A família, a criança, o adolescente e a pessoa com deficiência têm proteção especial (arts. 6º, 7º, 226 e 227); e
- A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, com status constitucional, reforça que o Brasil deve assegurar condições reais de inclusão e cuidado.
Justiça de gênero
Esse julgamento, de acordo com Taciela, também tem uma dimensão de equidade de gênero. “Sabemos e estatísticas comprovam que, na prática, a maior parte da carga de cuidados familiares ainda recai sobre as mulheres”. Em sua visão, o reconhecimento do TST pela necessidade de ajustar a jornada, contribui para diminuir a exclusão feminina do mercado de trabalho e para afirmar que a maternidade e a responsabilidade familiar não podem ser vistas como obstáculos profissionais.
“Mais do que isso: a decisão traz uma mensagem de humanização do trabalho, que envolve pessoas, histórias, famílias”, afirma a juíza federal. “Ao permitir a redução da jornada em situações extremas, o Judiciário afirma que o ambiente de trabalho deve ser também um espaço de solidariedade, respeito e dignidade”.