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A arte de não ceder

Barrar pedidos que ultrapassam o bom senso tem vantagens, mas não agrada a todos. É o que demonstra o livro Como Colocar Limites, de Melissa Urban.

Por Redação
4 ago 2023, 07h00
Ilustração de uma mão desenhando um traço em uma superfície rosa. Nela, há uma pessoa prestes a cruzar o traço
 (Westend61 / Gettyimages/Divulgação)
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eceber um WhatsApp do chefe no meio de um domingo, quando você está curtindo um churrasco com a família e amigos. Quem nunca? E aí, responder ou não?
Estabelecer limites no trabalho não é fácil. Nem dentro da própria casa. Impor um basta ao sogro que dá palpites sobre a educação de seus filhos pode ser interpretado de forma negativa – e até gerar um pequeno drama entre parentes. Assim como negar espaço à vizinha enxerida, ao amigo folgado, às crianças que só sabem pedir. Fechar algumas portas pode parecer arrogância e egoísmo. Ainda que seja só você tentando salvar a sua saúde mental.

No ambiente corporativo, dizer “não” ao pedido de estender uma reunião no fim do expediente – ou a trabalhos que não estão no seu acordo com a empresa – é capaz de acabar com a boa vontade de um gestor. Mas, acredite, o erro não está em você.

Ao estabelecer limites com confiança, você faz com que os outros comecem a respeitar os seus desejos. Vai melhorar sua capacidade de diálogo, seu equilíbrio psicológico e fazer com que chefes e colegas percebam quais são os seus valores.

É o que demonstra Melissa Urban em seu livro Como Colocar Limites – Melhore seus relacionamentos e conquiste sua liberdade. Essa autora americana estudou a fundo as consequências de não ceder ao que parece errado, apesar das reações contrárias e das pressões na vida pessoal e profissional. A escritora recomenda para todo mundo: “Eu não peço desculpas por estabelecer esses limites porque, quando expresso minhas necessidades de modo direto e educado, não há razão para sentir culpa”.

Trecho do livro

Os limites no trabalho têm sido um tema recorrente desde março de 2020, quando a covid-19 embaralhou o emprego, a casa, os filhos, a escola e o lazer. Faz 12 anos que eu trabalho em casa, e aprendi há uma década que, se não estabelecesse limites quanto ao “horário de trabalho” e ao “horário de descanso”, literalmente jamais sairia do “escritório” (em 2010 eu respondia a e-mails na cama às 11 da noite). Mesmo assim, durante a pandemia, quando eu fazia reuniões pelo Zoom no canto mais limpo do meu quarto ao mesmo tempo que supervisionava as aulas do meu filho também pelo Zoom na sala de jantar, além de cozinhar, fazer faxina, lavar roupa e entreter um entediado garoto de 7 anos, minhas habilidades de especialista em limites foram postas à prova.

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As pessoas pegarão tudo o que você se dispuser a dar

Esteja você trabalhando em casa ou no escritório da empresa, atendendo a clientes ou administrando um site profissional, tendo ou sendo chefe, a maior lição que aprendi quando entrei no mercado de trabalho é que as pessoas pegarão tudo o que você se dispuser a dar. Não é um juízo de valor; é apenas a natureza humana. Descobri isso nos primeiros dias do Whole30 [um programa nutricional criado pela autora], quando estávamos tentando impulsioná-lo e eu era a única pessoa cuidando dos e-mails e da nossa página no Facebook. Se uma pergunta chegasse às 9 da noite, eu sentia que precisava responder. Se um pedido entrasse na manhã de sábado, eu interrompia a malhação, o café da manhã ou as compras para dar atenção àquilo. Se alguém mandasse uma pergunta ao blog, eu ficava acordada até a meia-noite escrevendo a resposta. Eu me esgarçava tentando estar em dez lugares ao mesmo tempo, me sentindo reativa, não proativa e me aproximando rapidamente da exaustão completa… Até que um amigo, também empreendedor, me disse: “Melissa, as pessoas pegarão tudo o que você se dispuser a dar. Você precisa estabelecer alguns limites”. Isso nos leva a um dos meus princípios mais importantes:

Não é função de ninguém adivinhar quais são os meus limites; sou eu que preciso estabelecê-los e mantê-los.

Isso se aplica a todas as categorias de relacionamentos, mas é muitas vezes desconsiderado no trabalho, especialmente se você trabalha em uma empresa. Costumamos presumir que as expectativas do nosso chefe, a cultura empresarial e as exigências do trabalho estão acima das nossas necessidades pessoais de limites saudáveis (e também do nosso direito de tê-los).

Mas essas suposições estão erradas. Sim, você aceitou o emprego. Sim, eles pagam para você trabalhar. No entanto, você tem todo o direito de exigir um ambiente de trabalho saudável, seguro e respeitoso, o que quase sempre implica estabelecer limites.

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O negócio é que a empresa onde você trabalha provavelmente não estabelece limites saudáveis para você de maneira proativa. É raro um gestor dizer a um funcionário: “Faz um ano que você não tira férias. Trate de aproveitar seu merecido tempo livre e prometo que não vamos incomodar enquanto você estiver fora”. A verdade é que, a menos que você impeça, a empresa, os gestores, os colegas e os clientes absorverão, famintos, todo o seu tempo, sua energia, seu espaço e sua atenção. Não é que eles sejam maus; é apenas como o mundo funciona. Todos sofrem pressão para fazer mais, produzir mais e ganhar mais dinheiro. (Isso se chama capitalismo, meu bem.) Motivo pelo qual você precisa criar limites fortes e saudáveis no local de trabalho.

O problema é que esses limites são extremamente difíceis por causa da dinâmica de poder, da cultura empresarial e da verdade fria e dura das consequências.

Lute contra o poder

Sempre que existe uma dinâmica de poder, seja do tipo pai e filho, professor e aluno ou chefe e funcionário, fica cada vez mais difícil estabelecer e manter limites. Se você é filho ou filha, aluno ou aluna, funcionário ou funcionária, a hierarquia determina que você deve receber ordens. Se sua chefe pede que você trabalhe depois do horário ou no fim de semana, ou que a substitua enquanto ela sai para almoçar e só volta horas depois, ela pode considerar sua recusa um ato de insubordinação. Essas dinâmicas de poder transformam em campo minado perguntas como “Você poderia vir trabalhar no seu dia de folga?”, “Sei que combinamos para a semana que vem, mas será que você consegue me entregar o projeto amanhã?” e “Topa sair comigo?”. (Sim, chefes ainda chamam funcionárias para sair e, sim, isso é tão problemático e desagradável quanto parece.) Ainda que essas dinâmicas de poder não deem a ninguém a autoridade para se aproveitar de você, a fronteira fica turva quando a pessoa do outro lado ocupa um posto acima do seu e você realmente precisa do emprego.

Não é somente a estrutura hierárquica que atua na dinâmica de poder no trabalho. E se você precisasse estabelecer limites com o seu colega de trabalho que, por acaso, também é parceiro de golfe do seu chefe? Ou com a colega com quem seu chefe (não muito secretamente) está dormindo? Mesmo que você não preste contas diretamente a essas pessoas, mesmo que elas tenham menos experiência e menos tempo de serviço que você, se seu chefe simplesmente gosta mais delas, você precisa agir com cuidado. (Essa empresa está começando a parecer o Big Brother, não é mesmo?)

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Além de toda essa dinâmica de poder, os sistemas de opressão disseminados na sociedade – machismo, racismo, homofobia e capacitismo, por exemplo – também estão presentes no ambiente de trabalho.

Se você é mulher, pessoa não branca, LGBTQIA+ ou portador de deficiência, existe mais uma dinâmica de poder a ser rompida para além da estrutura básica da sua equipe. Por exemplo, recentemente tive contato com uma mulher negra chamada Victoria, que trabalhava numa empresa de tecnologia e precisou se integrar no que chamou de “cultura dos manos”. Victoria começou no atendimento ao cliente e chegou a gerente de produto, sempre se esforçando para atender às expectativas de gênero. Sentia que precisava rir das piadas machistas, escrever sozinha as atas das reuniões e desconsiderar os próprios feitos, mesmo quando atingia uma meta importante.

Quando tentava estabelecer limites saudáveis, costumava ser rotulada de “raivosa” ou “agressiva”, estereótipos comuns para mulheres negras nos Estados Unidos.

Victoria me contou: “O pior foi que eu comecei a internalizar a misoginia e o racismo no ambiente de trabalho. Desencorajava minhas colegas de equipe a denunciar maus comportamentos, a ser incisivas demais ou a estabelecer limites saudáveis em relação ao tempo, enquanto os homens da empresa podiam ser ofensivos, petulantes ou exigentes à vontade, sem que ninguém achasse aquilo minimamente estranho”. Depois de aprender mais sobre limites, usar alguns dos meus roteiros e dirigir aos colegas de trabalho perguntas difíceis, como “Mas é mesmo agressivo pedir que você não me interrompa nas reuniões?”, Victoria disse que o clima melhorou. Os colegas começaram a respeitar suas opiniões e até mesmo a brincar com ela: “Vamos perguntar isso à Victoria, ela manda logo a real”. Além disso, ela passou a encorajar seus subordinados diretos a discutir com ela os limites necessários; assim, ela poderia ajudá-los quando precisassem estabelecer limites para outras pessoas. “Nem sempre é fácil, e a mudança pode ser lenta”, contou ela. “Mas minha relação com a equipe está muito melhor, e isso renovou minha confiança no trabalho.”

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