Como a precisão do prompt vira vantagem competitiva no uso da IA
A inteligência artificial pode promover aprendizagem transformadora. Mas os SLAs precisam estar todos no que você pede: o quê, para quê, como, quando etc.

Diversos profissionais estão sendo substituídos por soluções baseadas em inteligência artificial. De terapeutas a professores de idiomas estrangeiros, passando por coaches, os profissionais das chamadas “profissões de ajuda” agora enfrentam a concorrência de uma IA disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, que sempre pode atender e que não cobra “nada” por isso. Sem pré-julgamento, resolvi investigar.
Após 15 anos de atuação na Cultura Inglesa de São Paulo, em funções como professora, coordenadora de cursos para adultos e gerente de T&D, entre outras – e, além dessa experiência prática, cursei o mestrado em aprendizagem de adultos nos EUA –, sou naturalmente curiosa com novas tecnologias de ensino-aprendizagem.
Minha primeira incursão no maravilhoso mundo da aprendizagem autodirigida de idiomas com suporte de IA foi solicitar ao Copilot que fizesse um roteiro de estudo para que eu pudesse revisar as primeiras unidades do livro que uso nas aulas particulares de italiano. Pedi que o roteiro fosse distribuído em pílulas diárias de no máximo 10 minutos e que durasse um mês, sendo que cada semana seria dedicada a uma unidade do livro. Solicitei a indicação de vídeos curtos, textos e artigos de jornais ou revistas, todos alinhados ao tema semanal. Enfim, eu queria uma curadoria de vídeos e textos relacionados às unidades já estudadas, mas queria material real, da internet, economizando o tempo de pesquisar as fontes. Em questão de minutos, o Copilot produziu o roteiro.
Animada, comecei a clicar nos hiperlinks e, estranhamente, eles sempre indicavam “page not found” (página não encontrada). Isso se repetiu rigorosamente para todos os links de vídeos e de textos no roteiro. Na prática, mostrou-se inviável. Fiquei com a impressão de que os tais links eram todos inventados, como temos lido em vários artigos recentes, pelo “receio” da IA em me desapontar.
Experimentei então outra abordagem. Pedi ao Copilot que conversasse comigo por áudio. Expliquei que era aluna iniciante de italiano e que gostaria de praticar vocabulário de situações como trocar informações pessoais (nome, endereço, profissão etc.). O Copilot começou a perguntar e, assim que dei informações pessoais (como endereço), ele apresentou instabilidade, interrompeu a conversa e informou que o diálogo infringia os termos de privacidade da empresa. Perguntei sobre o que ele poderia falar, e a resposta foi que podíamos falar sobre hobbies e rotina.
Seguimos por esse caminho, mas a conversa estava bem “truncada”. Não desisti. Pensei que, se as pessoas estão aprendendo idiomas com o apoio do ChatGPT, eu também vou aprender. Resolvi tentar o Gemini. Lá tentei usar a situação de ir a um restaurante e conversar com o garçom. O Gemini falava direito em italiano, mas não entendia que eu estava falando em italiano e me corrigia como se eu tivesse falado algo em português. Isso aconteceu mesmo quando eu escrevi que tanto ele quanto eu estávamos falando em italiano. Não adiantou. A experiência revelou-se frustrante e pouco produtiva.
Imagino que, se eu mudasse as configurações do Google para idioma italiano, talvez desse certo, mas preferi voltar ao Copilot e pedir a mesma coisa. Dessa vez, fui bem específica no pedido, incluindo as etapas da conversa, o papel de cada um no diálogo e que eu esperava que ele não me corrigisse durante o processo. Solicitei, ao final do diálogo, que o texto fosse registrado para leitura posterior. Pude ler nossa conversa e ele me ofereceu: “Se quiser, posso transformar esse diálogo em um pequeno áudio teatral ou até em um sketch para praticar italiano. Que tal?”. Adorei.
Comunicação precisa ser clara e no alvo
Fiquei refletindo sobre a importância de pedidos específicos. Durante minha atuação como coordenadora de cursos, promovia treinamentos voltados ao aprimoramento das instruções dadas pelos professores. Não é algo trivial. Hoje mesmo, na academia, o professor me passou um exercício e, antes que eu pudesse chegar ao equipamento para iniciar, uma colega se adiantou e começou a fazer o exercício no equipamento para o qual ele havia me direcionado. Ele riu e chamou a colega até outro equipamento, para que fizesse o exercício que ele estava preparando para ela. Ela retrucou: “Por favor, se comunica!”.
Quantas vezes acreditamos ter nos comunicado claramente, mas deixamos diversas expectativas implícitas? A depender do grau de tolerância à ambiguidade de nosso interlocutor, é possível que ele faça mais – ou menos – suposições e inferências e que possa “completar” o pedido, mesmo quando impreciso.
Com uma IA é a mesma coisa e a precisão da linguagem se torna ainda mais importante para o sucesso da resposta que será apresentada. Não é suficiente solicitar “quero praticar italiano em uma situação de restaurante” e esperar que o assistente de IA, promovido a professor, saiba exatamente o que fazer. Em vez disso, nosso pedido precisa ser detalhado: “Quero praticar um diálogo em que você será o garçom e eu a cliente. Quero que você me dê as boas-vindas, me pergunte para quantas pessoas é a mesa, me deixe escolher a mesa (ofereça dentro do salão, perto ou longe da janela, na varanda ou no jardim), me diga quais são as opções de pratos do dia e bebidas; depois, me pergunte sobre a sobremesa e café. Quero também que, ao trazer a conta, me ofereça formas alternativas para pagar (como cartão de crédito, cartão de débito ou dinheiro). Caso eu erre ou tenha dificuldade, me ajude, mas não me corrija. Não saia do papel de garçom”.
Você consegue ter aprendizagem autodirigida?
Ou seja, os SLAs (Acordos de Nível de Serviço) precisam estar todos registrados no prompt que você escreve para a IA: quem, o quê, para quê, como, quando etc. Como aponta David Merrill, no princípio da aplicação, instruções claras e contextualizadas aumentam a probabilidade de sucesso na execução de tarefas – algo que se aplica tanto ao ensino presencial quanto à interação com sistemas de IA.
Pretendo continuar utilizando o Copilot como parceiro de prática em italiano. Essa investigação me deixou com gostinho de “quero mais”. A autonomia e a liberdade de escolha que a IA oferece é incrível. É ensino sob demanda, customizado para minha necessidade, quando eu quiser. O fato de ela permitir que eu pratique a competência – falar um idioma estrangeiro – que quero desenvolver é de muita utilidade. Tenho certeza de que outras competências podem ser praticadas sob a supervisão da IA, desde que saibamos o que queremos aprender e façamos pedidos precisos de como queremos fazer isso.
O desafio está na capacidade do aprendiz de ser autodirigido. Como destaca Malcolm Knowles, referência na teoria da aprendizagem de adultos, a autodireção é um elemento central: adultos aprendem de forma mais eficaz quando assumem o controle do próprio processo de aprendizagem e percebem relevância imediata no conteúdo. Entretanto, nem todos tiveram experiências educacionais que estimularam seu protagonismo.
Nesse sentido, a IA pode ser um catalisador de aprendizagem transformadora, alinhando-se ao que Jack Mezirow descreve como a importância da reflexão crítica para ressignificar experiências e ampliar perspectivas. Ao assumir o papel de protagonista, o aprendiz não apenas direciona seu desenvolvimento, mas também potencializa o impacto das ferramentas digitais no alcance de objetivos pessoais e profissionais.
E você? Está pronto para assumir o papel principal no seu próprio aprendizado e explorar todo o potencial que a inteligência artificial pode oferecer ao seu desenvolvimento?