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Vívian Rio Stella

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Doutora em Linguística pela Unicamp. Idealizadora, curadora e professora da VRS Academy, pesquisa e desenvolve trabalhos voltados à lifelong learning
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Como perceber e evitar as microagressões no cotidiano

Muitas agressões são naturalizadas na nossa sociedade — e é aí que mora o perigo de criar muros quase intransponíveis entre as pessoas

Por Vivian Rio Stella, colunista de Você RH
Atualizado em 11 abr 2022, 16h51 - Publicado em 17 mar 2022, 06h44
Mulher segura o rosto com as mãos enquanto olha para o chão
 (Pexels/Liza Summer/Divulgação)
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“Você é a menina que vai dar o curso?”, “seu marido não se importa que você viaje tanto a trabalho”, “mas de novo grávida!”, “você não tem dó de deixar suas filhas sozinhas”, “só te peço uma coisa: não venha de saia para dar a palestra”. Essas são algumas frases que ouvi ao longo da minha carreira. Algumas me afetaram mais do que outras, seja pelo que tematizam, seja pela quantidade de vezes que já as escutei.

Curioso é que muitas delas podem ter sido ditas sem intenção de agredir e muitas são naturalizadas na nossa sociedade. E é aí que mora o perigo de criar muros quase intransponíveis entre as pessoas. Um perigo chamado microagressões.

Por definição, as microagressões são comentários, perguntas ou ações dolorosas que questionam ou colocam em validação uma pessoa de um grupo considerado discriminado ou sujeito a estereótipos amplamente disseminados. O que torna essas colocações tão desconcertantes é que elas acontecem casualmente, sem nenhuma intenção negativa ou hostilidade por trás (Derald Wing Sue).

“Ah, ela está de TPM hoje”, “fala mais um pouco que esse seu sotaque é tão engraçadinho”, “como é que fala lá na sua terra isso mesmo?”, “cuidado que a água daquele departamento engravida”, “ah, você não é da geração high tech que sabe tudo?” são só alguns dos muitos exemplos de microagressões. Claro que são frases tiradas de contexto, algo que faz toda diferença para o sentido. Mas dificilmente essas ou as frases que listei no começo do texto seriam adequadas, mesmo que a intenção fosse a melhor possível.

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Agora veja se reconhece microagressões em situações como essas. Alguém é questionado por estar no acesso social de um condomínio, sendo que essa pessoa é moradora e foi abordada, provavelmente, por sua aparência. A mesma aparência que faz com que uma pessoa com traços associados a asiáticos seja elogiada por seu inglês fluente, mesmo tendo o inglês como língua materna. Um homem negro na fila da primeira classe ser questionado pelo profissional da companhia aérea se ele está na fila correta. Ou uma mulher que mal consegue conduzir uma reunião, por ser constantemente interrompida e questionada por seus colegas homens.

Mesmo que sejam um pouco diferentes de atos ou comentários abertamente preconceituosos, as microagressões reforçam desprezo, indignidades, depreciações e insultos diários que negros, mulheres, populações LGBTQIPA+, pessoas com deficiência ou pessoas silenciadas e/ou marginalizadas vivenciam em interações cotidianas em diferentes contextos.

Por que essa discussão é tão necessária em empresas e na convivência social e familiar? Para percebermos que propiciar ambientes de segurança psicológica, construirmos relações saudáveis e empáticas e exercer liderança humanizada passa por cuidar de palavras e atitudes. Uma liderança, por exemplo, que propaga microagressões não gera engajamento e resultados, mas sim medo e desconfiança; uma empresa que age em prol da diversidade tem atitudes e modos de expressar distintos dos comentários que reforçam estereótipos.

Não, não é sobre mimimi ou sobre ser ou não sincero (até porque sinceridade leva em conta que o que é dito é recebido por alguém). É sim sobre ressignificar a nossa relação com as palavras para respeitar, sair do automatismo e desnaturalizar a invisibilidade de muitas vozes. Porque “a língua não é somente a expressão da ‘alma’ ou do ‘íntimo’, ou do que quer que seja, do indivíduo; é, acima de tudo, a maneira pela qual a sociedade se expressa como se seus membros fossem a sua boca” (Jacob Mey).

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Como bem afirma Claudio Thebas, em seu precioso livro “Ser bom não é ser bonzinho”, “o nosso pequeno e extraordinário desafio é cruzar o muro que construímos entre as nossas relações cotidianas(…): por trás das palavras chefe, doutor, vizinho, cunhada, sogra tem uma pessoa”. E se as microagressões criam muros, como diz Thebas, também existem frestas.  Só as encontramos se:

  • pararmos para ler, refletir, ouvir e perceber os comentários que ferem e agridem os outros, mesmo sem intenção;
  • sairmos da bolha que habitamos e convivermos com as pessoas dos mais diversos repertórios e vivências;
  • criarmos ambientes propícios ao diálogo, ao respeito e à diversidade de vozes.

Este texto, portanto, não é uma ode ao policiamento de tudo e todos, e sim um convite para identificar as microagressões que povoam o cotidiano e ressignificar nossa relação com as pessoas por meio das palavras. Afinal, como bem diz John Naisbitt, “os avanços mais emocionantes do século 21 não ocorrerão por causa da tecnologia, mas por conta de um conceito em expansão do que significa ser humano”.

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