Por que estamos perdendo a capacidade de manter a atenção
Mesmo sabendo que a atenção focada traz resultados superiores, vivemos anos à sombra da ideia de que o comportamento multitarefa é mais vantajoso
ocê se orgulha de ser multitarefa? É bem possível que você tenha respondido “não” para essa pergunta. Afinal, nesta altura do campeonato, muito já foi dito a respeito dos impactos negativos de executar tarefas simultâneas em nossa rotina, principalmente no trabalho. Salvo raras exceções, hoje sabemos que o trabalho focado é capaz de trazer resultados superiores, reduzindo erros e perda de performance. Mesmo assim, posso apostar que você ainda divide sua atenção muito mais vezes do que deveria ao longo do dia. Estou errada?
Acontece que vivemos anos à sombra de uma mentalidade problemática: a ideia de que o comportamento multitarefa é mais vantajoso para as pessoas. E como se já não bastasse, vivemos diariamente uma verdadeira avalanche de estímulos. Das mensagens instantâneas às inúmeras ofertas de conteúdos (alô infodemia!), passando pelas notificações das redes sociais e essa constante sensação de urgência que tanto nos aflige, o que não falta são empecilhos para mantermos a concentração em uma única atividade. Nossa mente sofre com constantes interrupções e, pouco a pouco, parece que estamos perdendo a capacidade de simplesmente prestar atenção.
Assim como a emoção e a memória, a atenção é vista como um fenômeno altamente complexo, cheio de nuances e peculiaridades. Muitos pesquisadores defendem que seria impossível para o cérebro processar da mesma maneira tudo o que acontece ao nosso redor. Por isso, o foco atencional é considerado um recurso fundamental, pois nos permite selecionar aquilo que é mais importante no ambiente, privilegiando seu processamento cerebral em detrimento dos demais estímulos. Em outras palavras, quando prestamos atenção em algo, nossa atividade cerebral é maior em resposta ao que estamos observando. E, claro, isso impacta diretamente a qualidade do que estamos fazendo.
Outro problema da falta de foco atencional está no impacto causado em nossa capacidade de entrega. Basicamente, o excesso de interrupções uma hora acaba gerando acúmulo de trabalho. E isso gera sobrecarga, que por sua vez gera frustração, que naturalmente acaba em… estresse! Quem nunca viveu essa história alguma vez na vida? Não é à toa que um dos antídotos para o languishing (um estado de perda de bem-estar) está justamente em desenvolver atividades de maneira focada.
Vale mencionar também os desastres que podemos causar dividindo a atenção enquanto tentamos nos comunicar com alguém. Uma das demandas de consultoria que mais recebo das empresas são justamente as relacionadas à comunicação. Como o comportamento multitarefas e o viés da urgência infelizmente ainda estão muito presentes em nossas rotinas de trabalho, é comum vermos problemas causados pela simples falta de atenção (de qualidade) durante as conversas.
A grande questão é que o foco atencional é único e não pode ser dividido. E isso vale para qualquer pessoa! Uma boa forma de entender o funcionamento desse fenômeno é usando a analogia da lanterna. Sempre que precisamos enxergar algo no escuro, direcionamos a luz principal da lanterna para aquilo que queremos ver. O mesmo acontece com o foco atencional. A cada momento, direcionamos nossa atenção voluntariamente ou automaticamente para o que é mais relevante no ambiente. E, sim, cada um de nós possui apenas uma lanterna disponível.
Quando falamos especificamente da importância de desenvolver atividades focadas, estamos falando de um tipo específico de atenção chamado Vigilância. A Vigilância diz respeito a nossa capacidade de sustentar o foco atencional em relação a um estímulo por períodos maiores, evitando que este seja deslocado para outros estímulos do ambiente. Desafiador, eu sei, mas essa é justamente a habilidade que precisamos exercitar. Como forma de privilegiar o trabalho focado, empresas apostam cada vez mais em técnicas de meditação, práticas de autogestão e na construção de ambientes e rotinas que favorecem o estado de Flow. A ideia é justamente desenvolver essa habilidade e, assim, aumentar a performance e o bem-estar das equipes.
E o que acontece quando tentamos ser multitarefa e desenvolver duas ou mais atividades ao mesmo tempo? Nesse caso, ao invés de dividir o foco, o que estamos fazendo é o chamado switch atencional, movimento que consiste basicamente em deslocar o foco entre estímulos em frações de segundos. O problema é que, mesmo que não percebamos conscientemente, tentar ser multitarefa pode ter um custo mais alto ao longo do tempo, gerando comprometimentos na qualidade do que estamos fazendo.
No entanto, é claro que há um motivo para termos desenvolvido essa habilidade. É que, em certas situações, rastrear estímulos e monitorar o ambiente também é algo muito importante. Nessas horas, a capacidade de trocar rapidamente o foco atencional entre diferentes estímulos ou atividades é uma grande vantagem. A chamada Seletividade é um recurso atencional particularmente relevante para profissionais que monitoram diferentes circuitos e ambientes, como acontece em alguns tipos de operação, por exemplo.
Nós dispomos de diferentes recursos atencionais, com diferentes características, e por isso é importante compreender as vantagens de cada um, como desenvolvê-los e quando utilizá-los. Já parou para pensar sobre quais das suas atividades deveriam ser realizadas de maneira focada? Por outro lado, em que momentos do seu dia o exercício da Seletividade pode ser vantajoso? O contexto, a natureza do trabalho e a forma como você organiza sua rotina serão determinantes para aproveitar o melhor de cada recurso.
Sim, o mundo moderno sem dúvida desafia a nossa capacidade de manter o foco. Por outro lado, certamente haverá momentos em que o uso de uma atenção mais difusa será estratégico. Assim, é importante aprender a distinguir entre ambos. Isso nos ajuda a navegar mais plenamente na complexidade do mundo atual. O objetivo é obter uma boa performance, mas sem descuidar da saúde.
Agora me conta, você tem conseguido controlar bem a sua atenção?
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