Fusões e aquisições: as lições dos médicos para os líderes
Um médico de UTI, um oncologista e um terapeuta de casais têm lições valiosas para empresas que enfrentam processos de fusões. Entenda
Um médico de UTI, um oncologista e um terapeuta de casais não são bem o estereótipo dos funcionários de Recursos Humanos de uma empresa, mas certamente têm muito para contribuir no dia a dia de grandes líderes e gestores. Sim, essa é parte de uma ‘equipe multidisciplinar’, composta por cerca de 80 profissionais, que criamos na iN, e que chancela a estratégia iN.Sighters, nome dado para nossa metodologia voltada a trabalhar de forma assertiva – com precisão cirúrgica – em momentos de incerteza.
Desde o início da pandemia, em março de 2020, vem sendo crescente o número de fusões e aquisições no país. A crise criou oportunidades para empresas comprarem concorrentes e até mesmo aumentarem seu leque de atividades, adquirindo startups de diferentes segmentos. 2020 bateu recorde em número de fusões e aquisições, de acordo com o Relatório de M&A da PwC, empresa de consultoria e auditoria que faz esse tipo de levantamento. Agora em 2021, segundo a consultoria Dealogic, o primeiro semestre já fecha superando o volume de transações do ano passado inteiro, movimentando US$ 52 bilhões nesses seis primeiros meses contra os US$ 45 bilhões de 2020.
Nervosismo no ar
E é nesse cenário que o clima de tensão se estabelece em grande parte dos ambientes corporativos. Operações de M&As demandam certo tempo até que de fato sejam concluídas. Mas como manter os colaboradores engajados durante esse período que pode levar um ou dois anos – ou até mais tempo?
Na maioria das vezes, com o intuito de não alarmar, os gestores tendem a se abster de dar mais informações aos seus colaboradores sobre o que está acontecendo. Tantas outras, essas informações são realmente confidenciais e não podem ser repassadas. Por isso, estabelecer uma comunicação transparente sem se aprofundar em detalhes, se torna um verdadeiro desafio na rotina das empresas que passam por esse processo.
Se eu puder dar uma dica, seria: trate o funcionário como adulto, Ciclos de fusão e aquisição tendem a ‘infantilizar’ as companhias, quando na verdade o colaborador só quer duas coisas: receber alguma informação sobre o que está acontecendo e que essa informação seja verdadeira.
Contar histórias que minimizem o impacto de uma informação dessa natureza só gera mais incerteza. São burburinhos e especulações que se transformam em uma bolha de tensão que envolve o funcionário e essa bolha é além-trabalho. Ela o acompanha no seu dia a dia, é levada para casa, para as férias, para o almoço em família e, inevitavelmente, mexe com a saúde mental do colaborador e sua produtividade, refletindo diretamente nos resultados da empresa.
Nesse momento é preciso que as informações cheguem de forma constante e esclarecedora. Mas como comunicar ao funcionário que a empresa em que ele trabalha está sendo comprada ou vai se unir a uma outra companhia? Como garantir a motivação para que ele mantenha seu ritmo de trabalho mesmo na incerteza de seu futuro profissional?
Times multidisciplinares
É aí que entra a equipe multidisciplinar. Fazendo uma analogia às situações de M&A, buscamos com diversos profissionais as soluções para cada etapa dessa transformação. Percebemos, por exemplo, que não há ninguém melhor que um oncologista para ensinar a lidar com tratamentos em que não existe uma certeza de sucesso. O paciente com câncer vive um dia de cada vez e precisa se manter motivado em dar continuidade aos procedimentos. É dessa mesma forma que um funcionário estabelece sua rotina quando seu posto de trabalho está em risco.
Percebemos que um terapeuta de casais pode contribuir para minimizar os efeitos de uma possível separação, um médico de UTI tem muito a falar sobre “ressuscitar” uma marca, e que um operador de voo aponta como a falha de comunicação pode ser fatal.
Durante esse exercício de busca e conhecimento dos processos, concluímos que temos que lidar com o assunto de forma humanizada, considerando o lado emocional das pessoas envolvidas. É essencial fazer essa imersão para garantir o bem-estar dos colaboradores, incentivando inclusive sua autonomia. Proporcionar treinamentos, eventos de motivação e integração faz parte desse ciclo. Afinal, fusões e aquisições lidam com, pelo menos, dois pontos de vista diferentes. São outros propósitos e valores, outra cultura. Precisamos enxergar a diversidade das organizações e, nesse momento, o profissional precisa se sentir acolhido e seguro, sabendo que independente de permanecer ou não na empresa, ele estará preparado para os novos desafios.
Mais proximidade
A troca entre líderes e colaboradores deve ser muito genuína. E não tem problema nenhum o gestor mostrar insegurança – afinal ele também enfrenta os mesmos receios. Mas ele precisa criar competências para passar por essa tormenta, pois há um medo de ser demitido e esse medo é real. Por essa razão, a comunicação honesta é tão importante. A partir dessa relação é que se dá início a todo o processo de transformação. Você então prepara as pessoas para o conjunto de crenças e valores de uma nova marca.
A grande maioria das fusões e aquisições não atingem a sinergia pré-deal exatamente pela falta desse trabalho com seus times. Quem recebe o ‘comprado’ faz muito pouco esforço para absorver novas pessoas. É por isso que desde o anúncio de intenção de um M&A à concretização da operação, é essencial que seja feito o acompanhamento diário dos funcionários, fazendo com que eles se sintam valorizados e que saibam que compõem parte desse novo ecossistema.
No fim das contas, o trabalho da liderança é árduo e constante, mas ele pode se inspirar em estratégias certeiras, contando com a experiência de médicos, pilotos de avião, filósofos, paisagistas, mestres de kung fu, militares e etc., além do RH e consultorias que dão um norte para deixar o processo mais humanizado. Um ciclo de fusão e aquisição nunca é fácil, no entanto ele pode ser simplificado se tratado com atenção e dedicação em todas as etapas de seu processo.