O falso sênior e seu impacto no setor de tecnologia
Promover profissionais que não estão preparados compromete a confiança e a produtividade da equipe, mas também a longevidade do negócio.

A disputa por talentos tech segue intensa. Mas o que chama a atenção em 2025 não é a dificuldade em contratar, mas o risco que muitas empresas assumem ao ceder à pressa. Cada vez mais encontramos profissionais assumindo cargos estratégicos sem um repertório compatível com a complexidade das respectivas funções, sendo colocados em posições de liderança antes de estarem preparados. As empresas tentam resolver urgências com atalhos – e isso tem um custo alto.
A pandemia pressionou empresas a tomarem decisões rápidas – e, muitas vezes, necessárias – para sustentar sua transformação digital. Nesse cenário, a valorização de talentos tech disparou, e a urgência por preencher vagas abriu espaço para promoções precoces e ajustes salariais fora da curva. Agora, é natural que o mercado reveja essas decisões e busque um novo ponto de equilíbrio.
O que define um profissional sênior não é o tempo de carreira, mas a consistência nas entregas, a capacidade de tomar decisões com autonomia e a maturidade para lidar com contextos complexos. Quando esse repertório não está presente, a pessoa pode até assumir o cargo, mas não vai sustentar o peso das responsabilidades. E aí começam os problemas: atrasos em projetos, ruídos na comunicação com outras áreas, decisões mal-estruturadas e um efeito cascata que desmotiva quem está ao redor.
Impacto na cultura
Em vez de acelerar a operação, a pressa em promover profissionais compromete a fluidez dos times. A liderança fragilizada gera insegurança, minando a confiança da equipe. Quando o “sênior” não sustenta o papel técnico ou comportamental esperado, é comum que outros assumam essa responsabilidade informalmente – criando um desequilíbrio silencioso, mas profundo, na dinâmica organizacional.
Quando a pressa define quem lidera, a estratégia paga o preço. Em muitas empresas de tecnologia, especialmente as que operam com squads compactos, vemos líderes técnicos recém-promovidos atuando sem a maturidade necessária. Isso gera lacunas importantes: falta profundidade na análise, visão de longo prazo e capacidade de antecipação. O reflexo aparece rápido – da arquitetura mal definida a entregas críticas que simplesmente não chegam.
É nesse ponto que o gap de senioridade deixa de ser uma questão individual e passa a comprometer a produtividade da empresa. Recrutar com base apenas em tempo de carreira ou títulos anteriores, especialmente em um mercado que inflacionou esses parâmetros, virou uma armadilha. O currículo pode dizer uma coisa; a prática, outra completamente diferente.
O que fazer?
O desafio, então, está em calibrar o olhar. Não basta saber se o candidato já fez algo. É preciso entender como fez, em que contexto, com quais trade-offs, e o que aprendeu no processo. Senioridade, afinal, é uma construção que exige vivência real, repertório técnico, consistência emocional e capacidade de navegar por caminhos nunca antes percorridos.
Enquanto o mercado não resgatar esse rigor na avaliação de perfil, seguirá alimentando uma cadeia frágil de lideranças sem preparo, e o prejuízo continuará aparecendo no produto, no time e nos resultados.
Não se trata de frear a ambição dos profissionais ou desacelerar o crescimento das empresas. Mas de colocar critério onde hoje existe pressa. A construção de uma jornada sênior exige tempo, repertório e entrega, e isso não se resolve com um título no LinkedIn (que convenhamos, aceita qualquer descrição).
Construir um mercado mais maduro passa por decisões mais responsáveis. RHs que valorizam o preparo, lideranças que inspiram com consistência e profissionais dispostos a crescer com profundidade – é esse o caminho. Porque a verdadeira senioridade não está no crachá, está na capacidade de sustentar impacto, orientar pessoas e gerar valor real.