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Para estas empresas, seus projetos pessoais valem na hora de promover

Para desenvolver e motivar os funcionários, as empresas incluem os objetivos pessoais dos empregados nas avaliações de desempenho

Por Natalia Gómez
Atualizado em 5 dez 2020, 20h48 - Publicado em 7 mar 2020, 10h00
Mauro Back, sócio e vice-presidente de pessoas e projetos estratégicos da ClearSale: a dedicação a projetos pessoais é levada em conta na hora de promover (Germano Lüders/VOCÊ S/A)
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Já faz algum tempo que as organizações entenderam que criar metas individuais, ligadas aos resultados do negócio, é fundamental para alinhar a estratégia. Porém, algumas das 150 Melhores Empresas vão além e incluem objetivos pessoais no plano de desenvolvimento dos times.

Elas perceberam que liberar uma parte da jornada dos empregados para que eles se dediquem a projetos que estão fora do escopo ­profissional ou destinem esse tempo para realizar atividades culturais, por exemplo, é uma ferramenta poderosa de crescimento pessoal e engajamento.

Empresas com esse perfil ainda são raras, mas a tendência é que esse modelo se espalhe, pois traduz algo cada vez mais valorizado no mundo do trabalho: o propósito.

“Os jovens que estão entrando no mercado buscam qualidade de vida, mais tempo para projetos pessoais e envolvimento com a comunidade”, diz Josué Bressane, diretor de gestão e performance da consultoria Lee Hecht Harrison.

Pessoal e profissional

No Brasil, algumas multinacionais, influenciadas pelas práticas da matriz, já aderiram à ação. Um exemplo é a Dow, gigante americana do setor químico. Na empresa, os funcionários podem incluir em seu planejamento de metas anuais projetos relacionados a diversidade e inclusão, como participação nos grupos de afinidade (gênero, raça, LGBTI+ e PCDs) ou em comitês de clima organizacional e qualidade de vida. Também há grupos para profissionais com mais de 50 anos e para os que estão na empresa há até oito anos.

A participação não é obrigatória, mas a adesão tem sido grande. Segundo a Dow, 48% de seus mais de 2 000 empregados no Brasil estão envolvidos em alguma dessas ações. “Apesar de não estarem ligadas à função do profissional, essas atividades entram na avaliação de desempenho e refletem na recompensa, porque consideramos que têm um potencial de impacto tão alto quanto as outras entregas”, diz Felipe Neufeld, diretor de recursos humanos da Dow para a América Latina.

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Ele explica que esses projetos estão relacionados ao objetivo da Dow de ser a empresa de ciência de materiais mais inclusiva do mundo e, por isso, são muito valorizados internamente. “Para nós, trabalhar esses temas melhora a imagem corporativa e aumenta a atração de talentos”, explica Felipe.

Vitrine corporativa

Na Dow, as atividades são realizadas durante o expediente e, para que isso possa acontecer, tudo é combinado previamente com a liderança. Dessa forma, as expectativas sobre o tempo que será dedicado aos projetos são alinhadas entre as duas partes. “Temos muita transparência para viabilizar os trabalhos e para todo mundo entender as prioridades”, afirma o executivo.

Para os funcionários, uma das vantagens é conseguir um crescimento de carreira mais acelerado, uma vez que eles são expostos a diferentes níveis da hierarquia e aumentam seu networking. Segundo Felipe, vários empregados também assumem posições de liderança nesses projetos paralelos, mesmo sem atuar como gestores.

Com isso, conseguem desenvolver habilidades como autoconfiança, influência e autonomia e se preparam para futuras oportunidades de carreira. “Muitas vezes, essas iniciativas têm impacto em um público interno muito maior do que a área de atuação da pessoa”, completa Felipe.

Outra empresa que enxergou nessa prática uma maneira de desenvolver seus funcionários é a Clear­Sale, que oferece soluções para prevenir fraudes na internet. Por lá, as metas pessoais fogem ainda mais do escopo da função dos empregados e incluem leitura de livros, cursos de teatro, idas a museus e outras atividades culturais.

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Além das ações fora do escritório, a área de cultura e comunicação, responsável por apoiar os funcionários, seleciona obras e realiza debates no auditório da empresa.

De acordo com Mauro Back, sócio e vice-presidente de pessoas e projetos estratégicos da ClearSale, a ação é uma maneira de olhar os empregados de forma mais integral. “Nós sempre dizemos aqui que não é possível separar o profissional do lado humano”, explica.

A companhia libera os funcionários 1 hora por semana para que se dediquem aos projetos; em contrapartida, exige uma carga horária mínima de 16 horas semestrais destinadas a eles. Todos os empregados, incluindo a alta direção, precisam participar, mas podem escolher o que fazer por meio de um aplicativo.

Embora não estejam atreladas à distribuição de lucros, as metas de desenvolvimento pessoal da ClearSale auxiliam nos processos de crescimento de carreira na empresa. Aqueles que não participam de pelo menos 75% das atividades propostas ficam impossibilitados de receber promoções no ano seguinte, por exemplo.

A realização dos objetivos também é requisito para utilizar benefícios como cursos de idiomas ou de especialização e academia e para participar de campeonatos esportivos internos.

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E se, à primeira vista, a realização de atividades como leitura de livros, trabalho voluntário e outras ações fora do ambiente corporativo não têm a ver com as funções dos trabalhadores, especialistas afirmam que elas têm muito a contribuir com as atividades do dia a dia.

Segundo o executivo da Clear­Sale, as aulas de artes dramáticas oferecidas para os empregados são um exemplo disso. “Para as pessoas que têm dificuldade de se comunicar, o curso de teatro ajuda a dar mais desenvoltura. Como lidamos diretamente com o público, isso também é muito bom para a empresa”, afirma Mauro.

Outro ganho é a possibilidade de adquirir competências que muitas vezes não podem ser ensinadas em treinamentos formais. “Para um profissional extremamente conservador, um curso de paraquedismo pode ser eficaz para ganhar capacidade de arrojo e ousadia”, exemplifica Wilma Dal Col, diretora da consultoria de gestão de pessoas ManpowerGroup.

A psicóloga Bela Fernandes, da consultoria Aylmer Desenvolvimento Humano: completa: “Isso também contribui para a inovação nas empresas, uma vez que profissionais que possuem hobbies ou trabalhos fora do escritório conseguem trazer pontos de vista mais diversos”.

Bom para todos

Além de ser uma alternativa para capacitação, levar em conta projetos e objetivos pessoais na avaliação de funcionários também contribui para a manutenção e motivação de talentos. A ClearSale aprendeu isso na prática.

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A companhia começou a considerar as atividades culturais no plano de desenvolvimento dos empregados em 2005, quando percebeu que estava perdendo muitos trabalhadores para grandes empresas de tecnologia. “Tínhamos de inovar para manter esses profissionais altamente concorridos”, explica Mauro.

A estratégia tem se mostrado acertada e, atualmente, o turnover geral da ClearSale está abaixo de 3%. No setor de call center, que emprega a maior parte dos 1 168 funcionários, a rotatividade é ainda menor, de apenas 2%, enquanto a média do mercado passa de 15%. “Essa ação dá força para reter os funcionários porque contribui para o clima interno da empresa”, diz o executivo.

Assim como a ClearSale, a Dow também avalia que a criação de metas que vão além dos resultados financeiros aumenta a satisfação dos trabalhadores e contribui para que eles pensem duas vezes antes de aceitar uma proposta de emprego da concorrência.

“Conseguir conectar o que as pessoas acreditam em sua vida pessoal ajuda a motivar e eleva a vontade dos empregados de permanecer na companhia”, afirma Felipe, da Dow. De acordo com ele, isso é um dos responsáveis pelo turnover da empresa, hoje de 3,7%.

De acordo com especialistas, a conclusão é verdadeira e torna-se crucial num cenário de escassez de profissionais qualificados. Segundo uma pesquisa da ManpowerGroup, por exemplo, 34% das organizações tiveram dificuldade de preencher vagas no Brasil em 2018, mesmo com os elevados níveis de desemprego. “Ter metas alinhadas com objetivos pessoais reforça a marca empregadora das companhias ­nesse contexto disputado”, afirma ­Wilma, da ManpowerGroup.

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O ganho de produtividade é outro efeito colateral. Segundo os especialistas, ter um espaço para desenvolvimento pessoal desperta um sentimento de pertencimento à organização, o que deixa os profissionais mais produtivos e impacta até a receita das empresas.

Mauro, da ClearSale, endossa essa crença. “Também enxergamos ganhos com saúde e bem-estar. Quando estão mais engajadas as pessoas ficam menos doentes e faltam menos ao trabalho. Com isso, há vantagens para ambos os lados”, afirma.

Cada vez mais empresas entendem que é preciso abraçar o lado humano dos profissionais para conseguir alavancar os resultados dos negócios e inovar em um mundo em transformação — e a criação de metas pessoais reforça esse pensamento. Contudo, os especialistas alertam que é preciso criar um ambiente no qual a existência de objetivos alinhados ao propósito faça sentido e não seja apenas modismo.

Por isso, é preciso deixar de fora a competição em excesso, o julgamento e a baixa tolerância com os erros. “Isso seria impensável no século 20, mas é a cara do século 21. Mais produtividade e mais criatividade são fundamentais para as empresas que estão no contexto atual”, diz Bela, da consultoria Aylmer.

No final, não adianta repetir exaustivamente que as pessoas são os maiores ativos das companhias se as formas de avaliá-las e recompensá-las ainda levam em conta apenas os resultados financeiros.


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