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Patricia Ansarah

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Criadora do Instituto Internacional de Segurança Psicológica (IISP).

Discordâncias estimulam a inovação – ao contrário dos “espaços seguros”

Na teoria, são escritórios com segurança psicológica. Na prática, lugares marcados por falsa harmonia, zero reflexão e pouco desenvolvimento profissional.

Por Patrícia Ansarah, colunista da Você RH
26 Maio 2025, 16h58
Fotografia de dois megafones discutindo com balões de fala e símbolos gráficos entre eles.
 (Richard Drury/Getty Images)
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A ideia de que “espaços seguros” garantem ambientes de trabalho saudáveis tem ganhado força entre as empresas, especialmente porque o bem-estar se tornou uma prioridade dos profissionais. Segundo um levantamento da Ipsos, por exemplo, 43% dos brasileiros preferem cuidar da saúde mental a receber uma promoção. Mas, quando mal compreendido, o conceito de “espaço seguro” pode levar as organizações diretamente para o buraco.

Geralmente entendemos que um espaço seguro é um lugar confortável e acolhedor, que oferece proteção e baixo risco aos profissionais. É uma ideia legítima. Mas, na prática, o conceito tem sido interpretado de maneira distorcida: é melhor não dizer nada para não causar desconforto. É melhor não contrariar, senão seremos vistos como alguém tóxico. O resultado? Relações marcadas por harmonia artificial, silêncio e zero reflexão.

O problema é que, ao tentar proteger as pessoas do desconforto, as empresas acabam protegendo-as também da verdade, do conflito saudável e da própria evolução. Criam-se ambientes em que todos tentam ser agradáveis e evitam qualquer confronto. Mas, como alerta Amy Edmondson, professora da Harvard Business School, conforto não é sinônimo de segurança. “E ser legal demais pode ser o caminho mais curto para a mediocridade.” Em nome da harmonia, sufocamos a coragem e a honestidade.

Segurança psicológica

O conceito de “espaço seguro” nasceu em contextos sociais marcados por opressão e exclusão. Surgiu como uma resposta à marginalização, oferecendo a grupos vulneráveis um ambiente onde pudessem existir com dignidade, ser ouvidos sem medo e compartilhar dores, vivências e identidades. Seriam áreas de proteção emocional, com caráter afetivo e temporário, onde a exposição é voluntária e regida por acordos coletivos. Contudo, basta um comentário mal colocado ou uma risada fora de hora para romper o equilíbrio e desmontar a sensação de acolhimento.

A segurança psicológica, por sua vez, está ligada à percepção coletiva de que o ambiente permite correr riscos interpessoais – errar, discordar, questionar e pedir ajuda, sem medo de punição ou constrangimento. Ela se manifesta no dia a dia, não apenas em espaços pontuais de acolhimento. Em equipes psicologicamente seguras, frases como “eu errei”, “alguém pode me ajudar com esse tema?” ou “o que não estamos perguntando?” são comuns. O desconforto não é evitado, mas bem-vindo, porque faz parte do crescimento.

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Evitar o desconforto é justamente evitar falas como essas. Quando isso acontece, as equipes entram no piloto automático. Ninguém quer ser o portador da má notícia, o chato que levanta uma preocupação importante, o desmancha-prazeres que faz perguntas nas reuniões. Com isso, projetos seguem sem questionamento, erros se repetem e a inovação se dilui. Equipes que evitam o desconforto, também evitam feedbacks, decisões impopulares, ideias que rompem padrões do “jeito que sempre deu certo”. A inteligência coletiva é bloqueada em troca de conforto, e o preço disso é alto.

Abraçando a complexidade

Para inovar, os profissionais precisam se arriscar. E fazê-lo na frente de outras pessoas, que não sabemos como vão reagir, gera desconforto. Por isso, ambientes sem conflito talvez não sejam maduros, mas silenciosos. O silêncio, nesse caso, é sinal de medo ou apatia, não de bem-estar. Como construir algo novo? Todo crescimento exige esforço criativo e coragem para sair do consenso.

É fundamental entender que segurança psicológica não é sinônimo de conforto constante, mas de confiança e abertura. Trata-se da base para que equipes possam experimentar, dizer “não sei”, enfrentar erros com ética e seguir em frente com mais aprendizado.

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Mas ainda há confusão sobre segurança psicológica. Líderes receosos e profissionais que usam a ideia de segurança como escudo para evitar críticas: tudo isso enfraquece a cultura de responsabilização. Quando isso acontece, as conversas difíceis desaparecem das salas de reunião e migram para o café, o grupo de WhatsApp ou o LinkedIn.

As empresas não devem proteger os profissionais da complexidade, mas aprender com eles a enfrentá-la. Se a segurança psicológica for confundida com proteção excessiva, corre-se o risco de criar ambientes emocionalmente frágeis, onde ninguém se responsabiliza, arrisca nem cresce, prejudicando o nível de engajamento e realização pessoal. Cedo ou tarde, isso leva organizações ao colapso – e arrasta junto quem está nelas.

Tanto os espaços seguros quanto a segurança psicológica têm seu valor. Um não substitui o outro, mas também não podem ser confundidos. Ambientes afetivos podem ser a porta de entrada para relações mais maduras. E ambientes psicologicamente seguros favorecem conexões autênticas, mesmo em meio a tensões. Segurança não está relacionada a evitar desconforto: mas a criar espaço para encontrar formas de lidar e aprender com ele.

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