Liderança ausente: o que acontece quando o chefe “deixa rolar”
Para especialistas, muitos gestores ainda confundem autonomia com abandono, acreditando que empoderam a equipe, quando, na verdade, criam um vácuo perigoso.
A ausência da liderança ativa abre espaço para fraudes e coloca a cultura ética da empresa em jogo. É o que conclui um novo estudo publicado na Humanities and Social Sciences Communications, da revista Nature, acendendo um alerta no mundo corporativo relacionado ao estilo de gestão laissez-faire (termo de origem francesa que significa “deixai fazer”). Nesta abordagem, a intervenção do líder é mínima, delegando a autonomia para a equipe tomar suas próprias decisões e gerenciar suas tarefas.
Isso até pode ser eficaz com equipes mais experientes e autogerenciadas, no entanto, o relatório mostra que a falta de gestão também pode ser um catalisador para comportamentos antiéticos no ambiente de trabalho. “O estilo passivo de liderança abre espaço para que funcionários com traços de personalidade manipuladora se sintam à vontade para praticar o ‘roubo de tempo’, seja registrando mais horas do que realmente foram trabalhadas ou reduzindo propositalmente o ritmo de suas tarefas”.
Desengajamento moral
Para Bia Tartuce, mentora de líderes, consultora de RH e psicóloga, a pesquisa traz um eco direto no contexto corporativo. “Muitos gestores ainda confundem autonomia com abandono”, afirma. “Eles adotam um estilo laissez-faire, acreditando que estão empoderando suas equipes, quando, na verdade, podem criar um vácuo perigoso onde a cultura ética se deteriora”.
Em ambientes com supervisão frouxa, de acordo com o estudo, os colaboradores tendem a desenvolver um “desengajamento moral”, justificando pequenas fraudes como se fossem aceitáveis. É nesse ponto, segundo Bia, que o papel do gestor se torna crucial. “É fundamental diferenciar os estilos de liderança: o ausente é aquele que delega e desaparece. Em contraste, o líder ativo, ou o que eu chamo de líder presente, é uma força constante de alinhamento e segurança”, afirma Bia.
Essa presença destacada pela mentora seria justamente o que combate os primeiros sinais de desvio. “Uma liderança ativa estabelece expectativas claras, promove um ambiente de responsabilidade e confiança e, principalmente, está atenta aos sinais de desengajamento moral na equipe”, descreve. “É aquele gestor que percebe a mudança de comportamento, a queda no comprometimento ou as justificativas que fogem à ética e atua antes que isso se normalize.”
A cultura construída em cada interação
No entanto, em tempos de trabalho flexível, com modelos remotos e híbridos, nem sempre é fácil ao líder garantir essa presença sem cair na armadilha da vigilância excessiva. Para Bia, a solução nesses casos está em rituais de conexão e clareza. “O líder é o guardião da cultura ética da equipe e ela não nasce de um pôster na parede; ela é construída em cada interação”. A psicóloga explica que a liderança precisa ser intencional desde o primeiro dia, comunicando os valores da empresa de forma prática. Até mesmo a distância.
“Existem ferramentas para isso, como, por exemplo, check-ins regulares não apenas para cobrar tarefas, mas para perguntar como o colaborador está; reuniões 1:1, que são espaços para ouvir, orientar e construir confiança; métricas claras e realistas, que diminuem a necessidade de ‘salvar as aparências’; e, por fim, uma comunicação aberta sobre desafios, na qual o próprio líder demonstra vulnerabilidade, criando um ambiente seguro para que a equipe faça o mesmo”, diz.
Entrevista: Ignacio Sánchez Villares, CEO da Leroy Merlin
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